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Como o caso de Preta Gil ajuda a entender o câncer no Brasil

Como o caso de Preta Gil expõe os desafios do câncer no Brasil e vira tema que conecta biologia, sociologia e atualidades no Enem.


Você provavelmente já viu as homenagens à Preta Gil nos últimos dias.

A cantora e empresária faleceu no dia 20 de julho de 2025, aos 50 anos, depois de lutar por mais de dois anos contra um câncer colorretal. Diagnosticada em janeiro de 2023, passou por quimioterapia, radioterapia e uma cirurgia de grande porte para remover tumores. Apesar de períodos de melhora, o câncer voltou com metástase (processo onde células cancerígenas se espalham do tumor primário para outras partes do corpo, formando novos tumores) em agosto de 2024, e ela chegou a buscar tratamento experimental fora do Brasil.

Casos como o dela – e também o de Pelé, que faleceu pela mesma doença – mostram como o câncer colorretal é grave e reforçam a importância de discutir o câncer como um problema de saúde pública que afeta milhares de brasileiros todos os anos. Quando pessoas conhecidas enfrentam doenças assim, o assunto ganha espaço na mídia e contribui para que a sociedade debata prevenção, diagnóstico precoce e acesso a tratamento.

Para quem está se preparando para o Enem, esse tipo de notícia vai além do impacto imediato. O câncer aparece na prova de forma multidisciplinar, seja em Biologia (com genética, fisiologia e tratamentos), em Sociologia (discutindo saúde pública e desigualdades) ou em Atualidades (com políticas públicas e avanços científicos). Saber analisar acontecimentos como esse e relacioná-los com diferentes áreas do conhecimento é uma habilidade muito valorizada no exame.

Qual o cenário do câncer no Brasil?

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O câncer é um dos maiores desafios de saúde pública no Brasil. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o país deve registrar cerca de 704 mil novos casos por ano entre 2023 e 2025. 

O câncer de pele não melanoma é o mais comum, representando 31,3% dos casos. Mas, se excluirmos esse tipo, os tumores mais frequentes são o câncer de mama feminino (10,5%) e o de próstata (10,2%). O câncer colorretal, que atingiu Preta Gil, é o terceiro mais comum, com estimativa de 45.630 novos casos por ano, sendo um pouco mais frequente em mulheres (23.660) do que em homens (21.970). Em 2021, o câncer foi a segunda maior causa de morte no Brasil, com 230 mil óbitos – desses, 20.245 foram por câncer colorretal em 2020.

A desigualdade regional na incidência

A distribuição dos casos de câncer no Brasil não é homogênea, revelando profundas desigualdades regionais e socioeconômicas. A taxa de incidência, excluindo o câncer de pele não melanoma, é 17% maior em homens (185,61 casos por 100 mil) do que em mulheres (154,08 por 100 mil), o que sugere a influência de fatores biológicos, comportamentais e até mesmo de acesso a serviços de saúde específicos para cada gênero.

Geograficamente, a concentração é gritante: Sudeste e Sul do país reúnem quase 70% dos casos, sendo metade apenas na região Sudeste. Essa disparidade não é aleatória; ela é um reflexo direto de múltiplos fatores, como:

  • Condições socioeconômicas: Áreas com maior desenvolvimento econômico e urbanização tendem a apresentar padrões de vida que podem influenciar a incidência de certos tipos de câncer (ex: dieta, sedentarismo, poluição). No entanto, também podem ter melhor acesso a diagnóstico e tratamento, o que distorce a percepção da real incidência em regiões menos favorecidas.
  • Ambiente: Fatores ambientais, como poluição do ar e da água, exposição a agentes químicos e agrotóxicos, podem desempenhar um papel crucial na etiologia de diversos cânceres.
  • Acesso à saúde: A concentração de infraestrutura de saúde de alta complexidade (hospitais oncológicos, clínicas especializadas, profissionais qualificados) nas regiões Sul e Sudeste impacta diretamente a capacidade de diagnóstico e tratamento. Regiões mais carentes enfrentam barreiras significativas, como a distância de centros de tratamento, a escassez de médicos especialistas e a falta de equipamentos, o que resulta em diagnósticos tardios e tratamentos inadequados.

Os desafios do SUS no tratamento do câncer

Apesar de avanços como a criação da Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer (PNPCC) em 2023, que busca reduzir casos e mortes e ampliar o acesso a cuidados integrados, ainda existem muitos problemas no SUS. Na prática, nem sempre a lei se transforma em cuidado efetivo.

Por exemplo, uma pesquisa do Fórum Nacional Oncoguia mostrou que 69% dos hospitais não enviaram protocolos completos de tratamento, o que indica desorganização. Além disso, há atrasos enormes: muitas vezes o diagnóstico demora até 200 dias, e 62% dos casos são descobertos já em estágio avançado, o que reduz as chances de cura. A “Lei dos 60 Dias” (Lei nº 12.732/2012), que garante início de tratamento nesse prazo após o diagnóstico, é descumprida em mais de 60% dos casos.

Outro problema grave é o acesso limitado a medicamentos mais modernos. No câncer de pulmão, por exemplo, ainda predominam remédios de primeira geração, e o tratamento mais usado para melanoma no SUS já foi abandonado em outros países desde 2011. Enquanto isso, terapias inovadoras como a imunoterapia seguem fora do alcance de muitos pacientes brasileiros.

A desigualdade regional no tratamento

Onde você mora faz diferença. Um estudo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná comparando Bahia e Paraná mostrou que, em 2023, o Paraná fez o dobro de exames de sangue oculto nas fezes e 1,4x mais colonoscopias do que a Bahia, mesmo tendo populações e incidência de câncer colorretal semelhantes. Além disso, o Paraná tem quase o dobro de hospitais especializados (34 contra 18 na Bahia). Com isso, pacientes baianos tiveram que viajar, em média, 109 km para tratamento, mais que o dobro do Paraná. No total, o Paraná fez quatro vezes mais cirurgias para câncer colorretal.

A própria Preta Gil falou sobre isso, criticando as longas filas para colonoscopia no SUS. Em muitos lugares, pessoas esperam mais de um ano por esse exame – tempo suficiente para o câncer avançar e até matar.

Prevenção e detecção precoce: por que são tão importantes?

Quando falamos em combater o câncer, duas estratégias são essenciais: o diagnóstico precoce e o rastreamento. Mas qual a diferença entre eles?

  • Diagnóstico precoce é quando a pessoa já apresenta sinais ou sintomas e busca atendimento rapidamente, aumentando as chances de cura, pois o câncer é tratado ainda no início.
  • Rastreamento é feito em pessoas que não têm sintomas, por meio de exames específicos, para identificar a doença antes que ela se manifeste ou avance. É o caso, por exemplo, da mamografia ou do Papanicolau.

Esses programas, quando bem organizados, conseguem reduzir bastante o número de casos graves e as mortes por câncer. Porém, para funcionar, é preciso que a população tenha acesso aos exames e saiba da importância deles.

No câncer colorretal, como o que vitimou Preta Gil, por exemplo, hábitos saudáveis – como alimentação rica em fibras, prática regular de atividade física, controle do peso e redução do consumo de álcool e carnes processadas – ajudam a prevenir a doença. Mas, além disso, existe o rastreamento com testes de sangue oculto nas fezes, como o FIT, que detectam sinais iniciais. Estudos na América Latina mostram que esse teste tem boa aceitação e consegue encontrar lesões antes de virarem câncer ou em estágio inicial, quando o tratamento é mais simples e eficaz.

Avanços, novas terapias e pesquisas

A ciência tem avançado muito no tratamento do câncer nos últimos anos. Novas terapias estão sendo desenvolvidas para tornar os tratamentos mais eficazes e com menos efeitos colaterais, aumentando as chances de cura e a qualidade de vida dos pacientes.

Ensaios clínicos

Um dos caminhos para trazer esses avanços para os pacientes são os ensaios clínicos. Eles são estudos feitos para testar novos medicamentos ou novas combinações de tratamentos antes que sejam aprovados para uso geral. Participar de um ensaio clínico pode dar acesso a terapias inovadoras que ainda não estão disponíveis no mercado. Porém, no Brasil, menos de 5% dos pacientes com câncer participam desses estudos.

Os motivos para essa baixa participação incluem:

  • A concentração dos centros de pesquisa em grandes cidades, o que dificulta o acesso de quem mora em regiões mais distantes.
  • A demora nos processos regulatórios, que atrasa o início dos estudos no país.
  • A falta de informação sobre o que são os ensaios clínicos, seus benefícios e segurança, tanto por parte dos pacientes quanto de muitos profissionais de saúde.

Imunoterapia e terapias-alvo

Entre as novidades no tratamento do câncer estão a imunoterapia e as terapias-alvo:

  • Imunoterapia: é um tratamento que estimula o próprio sistema imunológico do paciente a reconhecer e atacar as células cancerígenas. Já existem imunoterapias aprovadas para diversos tipos de câncer, como melanoma, pulmão e rim. Elas costumam ter menos efeitos colaterais do que a quimioterapia tradicional e podem aumentar significativamente a sobrevida em casos avançados.
    No SUS, a primeira imunoterapia para melanoma metastático foi incorporada apenas em 2019, mostrando que, apesar dos avanços, ainda há um longo caminho para ampliar o acesso a essas terapias no sistema público.
  • Terapias-alvo: são medicamentos que atacam alterações específicas das células tumorais, sem afetar tanto as células normais do corpo, como acontece com a quimioterapia. Isso significa tratamentos mais direcionados e com menos efeitos colaterais.

Medicina personalizada no Brasil

Além de acompanhar pesquisas internacionais, o Brasil também desenvolve ciência de ponta na área de oncologia. Um exemplo é o projeto do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), que está criando o “quimiograma tumoral”. Nesse método, células do tumor de cada paciente são cultivadas em laboratório, formando mini tumores tridimensionais, chamados de organoides. Esses mini tumores são usados para testar diferentes medicamentos e descobrir quais funcionam melhor para cada pessoa.

Essa técnica faz parte da chamada medicina personalizada, que busca definir o tratamento mais eficaz para cada paciente de forma individualizada. Com isso, os médicos podem escolher a terapia com maior chance de sucesso e menor toxicidade, evitando tentativas que não trariam benefícios.

Por que esse tema importa para você que está fazendo Enem?

O câncer é um tema que aparece com frequência no Enem porque exige que você conecte diferentes áreas do conhecimento para entender um problema real e complexo, que afeta milhares de pessoas no Brasil e no mundo.

Biologia

Nas questões de Biologia, o Enem aborda o câncer sob vários aspectos, como:

  • Mutações genéticas: alterações no DNA que podem dar origem às células cancerígenas.
  • Ciclo celular: como o crescimento descontrolado das células forma os tumores.
  • Tratamentos: mecanismos de ação de terapias como a quimioterapia, a imunoterapia e os medicamentos-alvo, incluindo seus efeitos sobre as células tumorais e normais.

Sociologia e atualidades

O exame também explora o câncer como um problema de saúde pública, trazendo discussões sobre:

  • Desigualdades no acesso à saúde: por que pessoas de regiões mais pobres ou afastadas têm menos acesso a diagnóstico precoce e tratamento.
  • Políticas públicas: como programas de rastreamento, campanhas de prevenção e leis específicas podem salvar vidas.
  • Impactos sociais e econômicos: os efeitos da doença não só na pessoa que adoece, mas também em suas famílias, no sistema de saúde e na sociedade como um todo.

Questões que já caíram no Enem

Questão 1 – Enem 2024

O Brasil somou cerca de 60 mil novos casos de câncer de mama até o final de 2019, número que corresponde a 25% de todos os diagnósticos da condição registrados no país, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca). Apesar de o Outubro Rosa ser o mês de conscientização sobre a questão voltada para as mulheres, é muito importante lembrar que um dos grandes mitos da medicina é o de que o câncer de mama não afeta o sexo masculino.

Fatores importantes para detectar o câncer de mama masculino:

1. Genética: se houver casos na família, as chances são um pouco mais elevadas.

2. Hormônios: homens podem desenvolver tecido real das glândulas mamárias por tomarem certos medicamentos ou apresentarem níveis hormonais anormais.

3.Caroços: é necessário que os médicos se atentem a alguns sintomas suspeitos, como um caroço na área do tórax.

4.Retração na pele: em situações mais graves do câncer de mama masculino, é possível também ocorrer uma retração do mamilo.

Disponível em: https://pebmed.com.br. Acesso em: 24 nov. 2021 (adaptado).

As informações dessa reportagem auxiliam no combate ao câncer de mama masculino por apresentarem um alerta sobre o(s):

a) sinais indicadores da doença.

b) índice de crescimento de casos.

c) exames para diagnóstico do tumor

d) mitos a respeito da herança genética

e) período de campanhas de conscientização.

Questão 2 – Enem 2020

Em uma pesquisa estão sendo testados cinco quimioterápicos quanto à sua capacidade antitumoral. No entanto, para o tratamento de pacientes, sabe-se que é necessário verificar também o quanto cada composto agride células normais. Para o experimento, partiu-se de cultivos de células tumorais (colunas escuras na figura) e células normais (colunas claras) com o mesmo número de células iniciais. Dois grupos-controle não receberam quimioterápicos: controle de células tumorais (CT) e de células normais (CN). As colunas I, II, III, IV e V correspondem aos grupos tratados com os cinco compostos. O número de células viáveis após os tratamentos está representado pelas colunas.

Qual quimioterápico deve ser escolhido para tratamento desse tipo de tumor?

a) I

b) II

c) III

d) IV

e) V

Questão 3 – Enem 2020

Pesquisadores dos Estados Unidos desenvolveram uma nova técnica, que utiliza raios de luz infravermelha (invisíveis a olho nu) para destruir tumores. Primeiramente, o paciente recebe uma injeção com versões modificadas de anticorpos que têm a capacidade de “grudar” apenas nas células cancerosas. Sozinhos, eles não fazem nada contra o tumor. Entretanto, esses anticorpos estão ligados a uma molécula, denominada IR700, que funcionará como uma “microbomba”, que irá destruir o câncer. Em seguida, o paciente recebe raios infravermelhos. Esses raios penetram no corpo e chegam até a molécula IR700, que é ativada e libera uma substância que ataca a célula cancerosa.

(Disponível em: http://super.abril.com.br. Acesso em: 13 dez. 2012. Adaptado.)

Com base nas etapas de desenvolvimento, o nome apropriado para a técnica descrita é:

a) Radioterapia.

b) Cromoterapia.

c) Quimioterapia.

d) Fotoimunoterapia.

e) Terapia magnética.

Questão 4 – Enem PPL 2022

Um dos fármacos usados como quimioterápico contra o câncer é a colchicina. Ela age como um bloqueador da divisão celular, intervindo na polimerização dos microtúbulos, formadores das fibras do fuso acromático, inibindo, assim, o crescimento do tumor. 

A colchicina age no tratamento do câncer, pois: 

a) inibe a atividade das mitocôndrias, diminuindo a produção de ATP. 

b) bloqueia a síntese proteica, o que impede a polimerização dos microtúbulos. 

c) impede a polimerização do fuso, que promove a condensação da cromatina nuclear. 

d) causa a despolimerização de proteínas do fuso, impedindo a separação das células-filhas no final da mitose. 

e) promove a despolimerização das fibras do fuso, impossibilitando a separação dos cromossomos na divisão.

Questão 5 – Enem 2024

Com base em testes realizados em ratos, concluiu-se que os compostos nitrosos são substâncias mutagênicas, ou seja, produzem mutações nas células e possivelmente câncer. Esses compostos podem ser obtidos pela reação entre o nitrito de sódio, que é um conservante adicionado às carnes, e o ácido clorídrico. O ácido nitroso produzido irá reagir com compostos nitrogenados, como as aminas, dando origem aos compostos nitrosos.

Em qual órgão esse processo será iniciado?

a) Rim.

b) Fígado.

c) Intestino.

d) Pâncreas.

e) Estômago.

GABARITO: 1. A // 2. B // 3. D // 4. E // 5. E

Autor(a) Luana Beatriz dos Santos

Sobre o(a) autor(a):

Luana Beatriz dos Santos -

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