Pepe Mujica: frases que você pode usar na redação do Enem

Descubra como frases de Pepe Mujica podem enriquecer sua redação do Enem com reflexões sobre justiça social, consumo e desigualdade.

Você já ouviu falar no Pepe Mujica? Ele foi presidente do Uruguai, faleceu em maio deste ano e ficou conhecido pelo jeito simples de viver e pelas ideias profundas que compartilha sobre política, sociedade e a vida em geral.

Neste texto, a ideia é trocar uma ideia sobre algumas frases marcantes do Mujica, entender o que ele quis dizer e como tudo isso tem a ver com o que você estuda na escola, especialmente em filosofia e sociologia.

E, claro, te mostrar como essas reflexões podem dar aquele empurrão na sua redação do Enem — tanto pra construir argumentos fortes quanto pra mostrar que você tem repertório crítico e sensível.

1. “Os que comem bem, dormem bem e têm boas casas, acham que se gasta demais em política social”

Essa frase, dita por Mujica no documentário Humano (2015), funciona como uma crítica direta à forma como as elites econômicas veem os investimentos em políticas sociais. Ele aponta como quem vive com conforto e segurança tende a não perceber a importância de programas voltados à redução das desigualdades. Para essas pessoas, o gasto com o social parece excessivo — justamente porque não enfrentam as dificuldades que essas políticas buscam combater.

Mujica está, na verdade, denunciando um desconhecimento sobre a realidade dos outros, algo que costuma acontecer quando o privilégio nos coloca em uma “bolha” de conforto.

Como relacionar com outros pensadores

A crítica de Mujica pode ser compreendida a partir das ideias do filósofo John Rawls, autor de Uma Teoria da Justiça. Para Rawls, uma sociedade justa é aquela que garante as maiores vantagens possíveis aos que estão em pior situação. Ele propõe um experimento mental: imaginar que estamos escolhendo as regras da sociedade sem saber qual será nossa posição social. Isso nos levaria a criar normas que beneficiem os mais vulneráveis.

Outro pensador que se relaciona com a frase de Mujica é Amartya Sen, vencedor do Prêmio Nobel de Economia. Para Sen, pobreza não é apenas a falta de renda, mas a privação de capacidades básicas, como acesso à alimentação, moradia e descanso. Isso significa que uma pessoa pobre não tem só menos dinheiro, mas também menos liberdade para viver uma vida digna.

A análise de Mujica também dialoga com os estudos de Pierre Bourdieu, sociólogo francês que investigou como a origem social molda nossa visão de mundo. Segundo Bourdieu, quem cresce em contextos de privilégio tende a naturalizar o conforto e, muitas vezes, atribui a pobreza à falta de esforço, desconsiderando as desigualdades estruturais.

A frase de Mujica escancara esse distanciamento: quem tem tudo, desde sempre, acaba vendo como “opcional” aquilo que, para outros, é urgente e essencial. Essa visão contribui para a manutenção das desigualdades e enfraquece o apoio a políticas públicas mais inclusivas.

2. “É bom viver como você pensa, caso contrário você pensará como vive.”

A frase sugere um alerta: se você não alinha suas ações aos seus valores, pode acabar moldando suas ideias para justificar um estilo de vida que não escolheu de forma consciente. Em outras palavras, adaptando seus princípios à rotina, ao consumo e às pressões sociais.

Esse pensamento é especialmente relevante para refletir sobre autenticidade, liberdade individual e a importância de manter uma postura crítica diante da realidade.

Como relacionar com outros pensadores

O conceito de alienação, proposto por Karl Marx, ajuda a entender a crítica embutida na frase. No capitalismo, o trabalhador muitas vezes perde o controle sobre sua própria vida e identidade ao ser reduzido à lógica da produção. Isso pode gerar um distanciamento de seus próprios valores e, com o tempo, levar à aceitação passiva das condições que o cercam.

Para Simone de Beauvoir, a liberdade está no ato de escolher conscientemente quem se quer ser. Viver sem refletir sobre essas escolhas pode nos levar a uma existência inautêntica. Se as decisões são feitas apenas por conveniência ou por conformismo, corre-se o risco de internalizar valores que, na prática, não foram verdadeiramente escolhidos.

Zygmunt Bauman, ao falar da modernidade líquida, mostra como os valores e comportamentos se tornaram instáveis. Em um mundo onde tudo muda rapidamente — desde relações pessoais até ideias políticas —, é fácil perder o eixo. A frase de Mujica pode ser vista como um convite à resistência diante dessa fluidez: manter uma base sólida de princípios para não ser moldado pelo fluxo.

3. “O mundo está mudando o tempo todo e, o que é pior, o tempo todo está mudando a teoria de como construir um mundo melhor.”

Com essa frase, dita no documentário Humano e também no seu discurso de posse, Mujica expressa uma percepção profunda: a sociedade está em constante mudança — e, junto com ela, mudam também as ideias sobre como transformá-la para melhor. Ele não critica apenas a velocidade dessas mudanças, mas a instabilidade das próprias teorias que deveriam orientar o progresso.

O trecho “o que é pior” revela uma inquietação com o fato de que nem mesmo as estratégias para melhorar o mundo permanecem sólidas por muito tempo. Mujica nos convida a pensar que, em vez de seguir uma linha reta, o progresso social é feito de idas e vindas, revisões e rupturas. Teorias que antes pareciam promissoras podem se tornar obsoletas, ineficazes ou até mesmo prejudiciais com o tempo.

Como relacionar com outros pensadores

Essa visão se aproxima da teoria dos paradigmas de Thomas Kuhn, que mostra como o conhecimento — inclusive o social — não evolui de forma linear, mas passa por “revoluções científicas”. Ou seja: quando um modelo dominante já não explica a realidade, ele é substituído por outro, completamente novo. A fala de Mujica se encaixa nesse raciocínio, sugerindo que a própria ideia de “mundo melhor” é sempre repensada conforme novas crises e contextos surgem.

Zygmunt Bauman também ajuda a entender essa sensação de instabilidade. Em sua teoria da modernidade líquida, ele afirma que vivemos em uma época em que tudo é fluido: relações, valores e, claro, as teorias sociais. O pensamento que antes parecia firme hoje é questionado, adaptado ou substituído com rapidez. A frase de Mujica reflete essa liquidez — a dificuldade de encontrar ideias sólidas em um mundo em constante movimento.

A fala de Mujica também se conecta a uma visão mais ampla da história das ideias. Ao longo do tempo, modelos sociais e políticos foram surgindo e desaparecendo à medida que novas necessidades e problemas se impuseram. O pensamento social, nesse sentido, é feito de ciclos: teorias ganham força, são contestadas e, eventualmente, cedem lugar a outras. Mujica nos lembra que não há respostas definitivas — apenas tentativas sucessivas de construir algo melhor.

4. “Aqueles que gostam de dinheiro devem ser expulsos da política. Eles são um perigo.”

Com essa frase contundente, Mujica expressa uma posição ética firme: quem tem como motivação principal o dinheiro não deveria ocupar cargos públicos. A declaração está em sintonia com sua trajetória pessoal e seu modo de vida austero, marcado pelo desapego material mesmo enquanto ocupava a presidência do Uruguai.

A frase toca diretamente na questão da corrupção, um problema estrutural que afeta a confiança da população nos sistemas políticos. Para Mujica, a busca por enriquecimento pessoal dentro da política não é apenas um desvio de conduta, mas uma ameaça real à justiça social e ao bem comum. A intensidade das palavras mostra que ele não vê a ambição financeira como algo neutro ou tolerável nesse espaço: ela compromete a legitimidade e a integridade de quem deveria estar ali para servir à população.

Como relacionar com outros pensadores

Essa crítica à ganância política tem ressonâncias na filosofia clássica, especialmente na obra A República, de Platão. O filósofo grego propunha que o governante ideal seria o “rei-filósofo” — alguém que não tivesse interesse em riqueza ou poder pessoal, mas que governasse com base na razão, na sabedoria e na justiça. Segundo Platão, quem busca governar motivado por dinheiro não é apto para o cargo, pois tende a priorizar seus próprios interesses em detrimento do coletivo.

A frase de Mujica ecoa esse ideal. Assim como Platão, ele acredita que o apego aos bens materiais compromete a capacidade de tomar decisões éticas e justas. Ao propor que pessoas movidas pelo dinheiro devem ser mantidas fora da política, Mujica reforça a necessidade de um perfil ético e comprometido com o interesse público — exatamente como o filósofo imaginava para seus líderes.

Outro pensador fundamental nesse debate é Maquiavel, especialmente em sua obra O Príncipe. Diferentemente de Mujica, Maquiavel tem uma abordagem mais pragmática da política: ele entende que, às vezes, o governante precisa tomar decisões duras — e até antiéticas — para manter a estabilidade do Estado. Nessa lógica, o foco está nos resultados, e não nas intenções.

Apesar de parecerem opostos, os dois pensadores se encontram ao tratar da relação entre ética e poder. Enquanto Maquiavel analisa os efeitos das ações políticas na manutenção do poder, Mujica se concentra nas motivações morais que levam alguém a entrar na política. Se para Maquiavel a ética pode ser flexível em nome da ordem, para Mujica, ela é um ponto de partida inegociável. A sua frase indica que permitir que pessoas obcecadas por dinheiro entrem na política é abrir espaço para os próprios desvios que Maquiavel identificava como riscos à estabilidade — mas sem relativizar sua gravidade moral.

Além do plano moral individual, há também o debate sobre como estruturar o poder para evitar abusos, o que nos leva à teoria da separação dos poderes, de Montesquieu. Para o pensador iluminista, a melhor forma de proteger a liberdade e evitar a corrupção seria dividir o poder entre diferentes instâncias do governo, criando um sistema de freios e contrapesos.

5. “O que é que chama a atenção mundial? Que vivo com pouco, em uma casa simples, que ando em um carrinho velho, essas são as notícias? Então este mundo está louco, porque o normal surpreende.”

Essa frase do Mujica é, ao mesmo tempo, um desabafo e uma crítica direta à forma como o mundo valoriza certas coisas. Ele está surpreso — e até um pouco irônico — com o fato de sua vida simples ter virado manchete internacional. O que ele questiona aqui não é só o espanto das pessoas, mas o que isso revela sobre os valores da nossa sociedade. Se o estilo de vida que deveria ser considerado comum — viver com o necessário, sem ostentação — vira algo digno de notícia, é porque talvez o que a gente chama de “normal” esteja, na verdade, completamente fora do eixo.

Como relacionar com outros pensadores

Esse tipo de crítica se encaixa bem nas discussões da sociologia contemporânea, especialmente quando falamos sobre consumismo. A sociedade moderna, guiada pela lógica do mercado, costuma colocar um peso enorme sobre a ideia de que sucesso e felicidade vêm do que se tem — do carro, da casa, das roupas, do status. E Mujica vai justamente na contramão disso. Ele expõe uma contradição: ao mesmo tempo em que muita gente diz buscar uma vida mais simples e autêntica, o padrão dominante ainda valoriza quem exibe riqueza.

O que Mujica diz também tem uma relação direta com duas correntes filosóficas clássicas: o estoicismo e o epicurismo. Os estoicos, como Sêneca e Epicteto, pregavam que a felicidade vinha da virtude, da razão e do domínio sobre os próprios desejos — ou seja, que não precisamos de riqueza para viver bem, mas sim de equilíbrio interior. Já os epicuristas, como Epicuro, acreditavam que o prazer era o objetivo da vida, mas não o prazer ligado ao luxo, e sim ao bem-estar básico, à amizade, à tranquilidade. Ambos os caminhos defendem uma vida centrada no que é essencial, o que se conecta diretamente com a postura de Mujica.

Mas é importante fazer uma distinção: a simplicidade de Mujica era uma escolha política e ética, não uma imposição da miséria. Ele tinha condições materiais de viver com conforto, mas preferiu manter um estilo de vida coerente com os princípios que defendia. Essa escolha voluntária é bem diferente da pobreza forçada, que atinge milhões de pessoas que não têm o básico por falta de oportunidades. Ou seja, quando Mujica fala em viver com pouco, ele não está romantizando a pobreza, mas propondo uma crítica à cultura do excesso.

Sobre o(a) autor(a):

Luana Santos - Formada em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina, é redatora com foco em educação, produção de conteúdo para o Enem e vestibulares. Atualmente, integra a equipe da Rede Enem, onde cria materiais informativos e inspiradores para ajudar estudantes a alcançarem seus objetivos acadêmicos. Ama café, livros e uma boa conversa sobre educação.  

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