Redação do ENEM: o que a série Adolescência, da Netflix, tem a ver com isso?

A série Adolescência, da Netflix, aborda temas como saúde mental, misoginia e redes sociais — tudo que pode cair na redação do ENEM.

A produção aborda temas como redes sociais, misoginia e saúde mental — todos com potencial para cair na redação.

Adolescência, série da Netflix criada por Jack Thorne e Stephen Graham, virou assunto sério: de debates no Parlamento Britânico a conversas nas escolas. Tudo isso por conta de uma trama densa e atual, que mostra como um menino de 13 anos pode chegar ao extremo de cometer um ato de violência — e os inúmeros fatores sociais, emocionais e culturais que o levaram até ali.

Mas o que essa série tem a ver com o ENEM?

A resposta é simples: tudo.

O ENEM — especialmente na prova de redação — tem priorizado temas que envolvem desafios contemporâneos, estruturais e sociais. E Adolescência entrega um retrato dolorosamente atual de problemas que o Brasil também enfrenta: a influência das redes sociais na formação dos jovens, a propagação de discursos de ódio, a crise da saúde mental e o machismo estrutural.

Se você está maratonando a série, saiba: está estudando também. E neste texto, vamos mostrar como Adolescência pode ser usada como inspiração para escrever redações mais profundas e conectadas com o mundo real.

Cultura incel, redes sociais e violência: temas para refletir (e escrever)

Jamie, o protagonista, é um adolescente socialmente isolado, lidando com bullying, inseguranças e a ausência de uma rede de apoio. A série mostra como ele encontra acolhimento em fóruns e vídeos que, disfarçados de “comunidades de apoio”, espalham discursos de ódio e ideologias extremistas.

É nesse universo que ele se depara com a cultura incel (abreviação de “involuntary celibate”, ou celibatário involuntário), um grupo online que costuma expressar misoginia, frustração e hostilidade contra mulheres.

No mundo real, isso também acontece. Segundo a pesquisa Algoritmos, Violência e Juventude no Brasil (Instituto Think Twice Brasil, 2023), 8 em cada 10 jovens brasileiros entre 13 e 24 anos já visualizaram conteúdos violentos, discriminatórios ou perturbadores nas redes sociais, incluindo cenas de misoginia disseminadas em vídeos curtos, memes e jogos online.

Já o estudo da organização britânica Hope Not Hate (2024) alerta para o papel de plataformas como YouTube e Twitch como vetores de radicalização de jovens, especialmente entre 13 e 25 anos.

Essa realidade levanta perguntas que poderiam muito bem aparecer como temas de redação:

  • Como combater a influência de discursos misóginos na formação de adolescentes?
  • Quais os impactos da cultura digital na saúde mental dos jovens?
  • Como garantir a proteção emocional de adolescentes nas redes sociais?
  • O papel da escola e da família na prevenção da violência juvenil.

Mais do que uma ficção, Adolescência se torna um convite à análise crítica de um cenário que atravessa fronteiras. Afinal, os mecanismos que empurram Jamie à violência são reais — e estão mais perto do que gostaríamos de admitir.

Saúde mental na era digital: uma crise silenciosa

Outro eixo central da série é o sofrimento emocional adolescente — algo que, infelizmente, também faz parte da realidade de muitos jovens. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), 31,6% dos jovens brasileiros entre 18 e 24 anos apresentam sintomas de ansiedade ou depressão.

Esse cenário se agrava quando observamos a relação com o uso excessivo das redes sociais: de acordo com a Fiocruz, adolescentes que passam mais de três horas por dia conectados têm o dobro de chances de desenvolver os sintomas dessas doenças

A constante busca por validação (likes, comentários) e a comparação com padrões irreais geram um ambiente propício à insegurança, à angústia e, em casos extremos, a surtos de violência, como o que vemos na narrativa de Adolescência.

No ENEM, um tema como “Os impactos da cultura digital na saúde mental dos jovens” permitiria que o estudante argumentasse, por exemplo, que a ausência de suporte emocional em casa e na escola pode tornar os jovens vulneráveis à influência de comunidades tóxicas online. Intervenções possíveis incluem:

  • Oficinas escolares sobre uso consciente das redes.
  • Apoio psicológico contínuo nas instituições de ensino.
  • Campanhas voltadas para pais, educadores e alunos.

A própria proposta do criador da série, Jack Thorne, de discutir uma espécie de “idade digital de consentimento”, dialoga com propostas reais de regulação do uso de smartphones e pode ser um argumento interessante para redações que pedem intervenções inovadoras e viáveis.

O machismo estrutural e o papel da educação

A cultura incel, presente na série, não é um fenômeno isolado. Ela se insere num contexto maior de machismo estrutural — aquele que atravessa todas as esferas da sociedade, inclusive a adolescência. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2025), 21,4 milhões de brasileiras com 16 anos ou mais já sofreram algum tipo de violência de gênero.

Na série, a misoginia aparece como um elemento internalizado por Jamie e seus colegas, mas que não é percebido (ou é ignorado) pelos adultos ao redor. Isso expõe a falha da família, da escola e até das instituições em identificar os sinais de alerta.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) já prevê o ensino de competências socioemocionais e temas como igualdade de gênero. No entanto, a implementação prática ainda é desigual. Nesse sentido, Adolescência pode ajudar a reforçar propostas como:

  • A inserção de rodas de conversa sobre masculinidades e igualdade nas escolas.
  • Projetos de mediação de conflitos com foco em empatia e escuta.
  • A valorização do protagonismo juvenil em iniciativas de combate ao machismo.

O papel da educação: tema constante no ENEM

O roteirista Jack Thorne defende mudanças radicais. Ele fala em proibir smartphones nas escolas, estabelecer uma “idade digital de consentimento” e reformular como tratamos o uso da tecnologia desde cedo. Polêmico? Sem dúvida. Mas necessário discutir.

E o ENEM adora esse tipo de discussão: propostas de intervenção concretas, viáveis e respeitosas aos direitos humanos. Assistir à série pode ser uma forma de exercitar esse olhar: o que poderia ser feito? Quem são os responsáveis? Que caminhos são possíveis?

O protagonismo das escolas e das famílias

A série também levanta uma discussão importante: até que ponto a escola e a família conseguem perceber os sinais de alerta? O que pode ser feito para construir um ambiente seguro, que ajude jovens vulneráveis a não mergulharem em discursos de ódio?

Essas questões têm tudo a ver com os chamados atores sociais que o ENEM sempre cobra nas propostas de intervenção da redação. Pensar em como a escola, o Estado, a mídia e as famílias atuam (ou falham) no enfrentamento de um problema é essencial para uma boa argumentação.

Assistir também é estudar

Se você está se preparando para o ENEM, não subestime o poder de uma boa série. Adolescência não é apenas entretenimento — é conteúdo. É argumento. É repertório sociocultural que pode enriquecer sua redação e sua visão de mundo.

Mais do que isso: é um alerta. Para pais, professores, alunos e para todos nós. Porque crescer num mundo digital exige mais do que regras — exige escuta, empatia e educação.

Sobre o(a) autor(a):

Luana Santos - Formada em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina, é redatora com foco em educação, produção de conteúdo para o Enem e vestibulares. Atualmente, integra a equipe da Rede Enem, onde cria materiais informativos e inspiradores para ajudar estudantes a alcançarem seus objetivos acadêmicos. Ama café, livros e uma boa conversa sobre educação.  

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