Você já deve ter lido várias crônicas por aí. A crônica trata de assuntos corriqueiros, em acontecimentos do cotidiano. Vamos observar suas características para dominar esse gênero discursivo e mandar bem no Enem.
Vamos começar logo pela definição de crônica, certo?
A crônica é um gênero discursivo que o autor manifesta, a partir de sua observação de relatos e fatos cotidianos, sua criticidade. Dessa maneira, traz para quem lê seu texto algo não estaria tão em evidência.
Por isso, podemos afirmar que o objetivo de uma crônica é revelar criticamente as mazelas da sociedade atual, algo que estaria invisível para a maioria das pessoas.
Cronistas do descobrimento
Não é à toa que o livro Cronistas do descobrimento, publicado pela primeira vez em 1999, organizado por Antônio Carlos Olivieri e Marco Antonio Villa, tem esse nome. Trata-se de uma coleção de cartas cujo conteúdo versa sobre primeiros contatos dos europeus com as terras brasileiras.
Nessa antologia, temos trechos da carta de Pero Vaz de Caminha, a Carta de Achamento, que traz informações sobre as pessoas que viviam aqui em 1500. Esse documento foi endereçado ao rei d. Manuel e é considerado a certidão de nascimento do Brasil.
A carta de Pero Vaz de Caminha tem a função de informar, buscando passar o máximo possível de fatos a respeito do que o escrivão presenciava.
Mas era carta ou crônica?
Como gênero, a crônica tem origem na história e na literatura. No período das grandes navegações, entre os séculos XV e início do século XVII, era comum ter um cronista que acompanhava essas expedições.
E qual era a função desse cronista? Narrar o que ocorria de maneira cronologicamente organizada. Naquela época, escrever uma crônica significava registrar, de modo fiel, uma série de acontecimentos ordenados no tempo.
A importância desse gênero para a história, nesse momento, se dá pela preservação de fontes sobre os fatos que ocorriam naquela época.
A crônica do século XIX em diante
Até o século XIX, ainda era muito comum encontrar crônicas que tinham esse formato, mas com uma diferença: elas passaram a registrar fatos cotidianos. Podemos citar dois nomes que, no final do século XIX, se tornaram grandes cronistas do seu tempo: José de Alencar e Machado de Assis.
Já que os cronistas também, muitas vezes, eram romancistas ou poetas, a crônica ganhou ainda mais espaço dentro da literatura.
Claro que a crônica sofreu algumas alterações no seu formato. Agora, por exemplo, em lugar de narrar vários acontecimentos típicos da sociedade, os cronistas começaram a se interessar por um único fato.
Depois de escolhido o assunto, o cronista já poderia abordar comentários mais amplos sobre como o fato apresentado poderia ser visto pelo leitor.
Crônica atualmente
Assim que essas mudanças significativas na crônica se tornaram consolidadas, esse gênero discursivo adotou a estrutura a finalidade que conhecemos hoje. Escrito para ser publicado em jornais, podemos afirmar que se trata de um texto opinativo.
No jornal, temos outros tipos de textos que têm caráter – pelo menos deveria – imparcial. Daí a crônica ser um contraste, pois traz a opinião de quem a escreve.
A crônica acaba por ser um avesso dos outros textos, pois é subjetiva, opinativa e parcial. Bem diferente da objetividade e da imparcialidade de notícias e reportagens.
Por onde circulam
Já dissemos isso aqui, a crônica tem lugar cativo no meio jornalístico. Muito fácil a encontrarmos em jornais diários que, habitualmente, têm espaço e autor fixo. Também podemos encontrar crônicas em revistas semanais. Geralmente, o texto vem publicado no início, funcionando como uma introdução às notícias semanais.
Sobre os temas das crônicas, não há uma regra fixa. Quanto mais variada for a abordagem jornalística, maior pode ser o leque de assuntos da crônica para essa situação.
As crônicas também podem aparecer em livros. Neste caso, é mais comum os autores reunirem um conjunto de textos que acreditam ser mais pertinentes às suas obras. Lembrando que também levam em conta assuntos atuais.
O perfil do leitor das crônicas
O perfil de quem lê crônica varia, pois depende muito de onde esse texto é veiculado. Fácil notar que o perfil de quem lê um jornal diário pode ser diferente de quem acompanha uma revista mensal.
Saber qual é o público do veículo onde a crônica será publicada é importante porque revela que tipo de assunto, apesar de ser atual, pode ser abordado.
Um cronista que escreve com certa regularidade em um espaço fixo dentro de um determinado periódico faz com que os leitores se aproximam mais desses autores, pois compartilham de suas opiniões.
A estrutura da crônica
Neste tópico, deveria aparecer algo como uma “fórmula” ou um “padrão rígido” para ser seguido a fim de se escrever – ou se identificar – uma crônica.
Não há. Que coisa, né?
O que podemos apontar é que a crônica tem alguns aspectos que costumam predominar nesse gênero discursivo.
Por meio de algumas experiências vividas pelo autor da crônica, podemos notar uma reflexão sobre o tema. Essa experiência que, em um primeiro momento, pode parecer única, ao longo do texto vai se tornando comum ao leitor.
Essa experiência vai se ampliando, ganhando relevância e abrangência até que alguns leitores se identifiquem com ela. Uma das funções da literatura é, depois de apreciada, aprender com o comportamento humano, e isso, por vezes, é possível com a crônica.
Temas diversos, crônicas diversas
Até aqui, já conseguiu imaginar quantos temas podem ser possíveis para uma crônica? Os tópicos podem ser os mais variados, não é? Por isso, é possível “tentar uma classificação” das crônicas, dependendo do assunto. Veja.
– Sobre o mundo: trata de assuntos característicos de uma sociedade.
– Lírica: traz o registro do estado de espírito do cronista.
– Filosófica: como o próprio nome diz, trata de um assunto mais abrangente.
– Humorística: traz uma visão irônica ou cômica de um fato. Luís Fernando Veríssimo é fera neste assunto.
– Jornalística: de maneira periódica e regular, trata de assuntos voltados às notícias de um jornal. Pode ser esportiva, política, policial.
Estudante: queremos que veja essa “classificação” apenas como uma referência, certo? Pois, em muitos casos, a crônica pode trazer mais de uma característica dessas.
Para fechar essa revisão, queremos lembrar que a linguagem de uma crônica, fica bem próxima da informalidade, bem próxima da coloquialidade.
O motivo para essa escolha de registro é simples, e você já deve ter adivinhado, certo? Como a crônica é de caráter subjetivo, nada melhor do que a linguagem coloquial para dar esse toque.
Para tirar todas as suas dúvidas sobre o que são crônicas, veja esta videoaula:
Agora, depois dessa revisão, bora fazer uns exercícios sobre o assunto. Bom trabalho!
Exercícios
1 – (UNIFOR CE/2019)
Assaltos insólitos
[…]
— É um assalto, fica quieto senão leva chumbo.
Ele já se preparava para toda sorte de tragédias quando um dos ladrões pergunta:
— Cadê o patrão?
Num rasgo de criatividade, respondeu:
— Saiu, foi com a família ao mercado, mas já volta.
— Então vamos lá dentro, mostre tudo.
Fingindo-se, então, de empregado de si mesmo, e, ao mesmo tempo para livrar sua cara, começou a dizer:
— Se quiserem levar, podem levar tudo, estou me lixando, não gosto desse patrão. Paga mal, é um pão-duro. Por que não levam aquele rádio ali? Olha, se eu fosse vocês, levava aquele som também. Na cozinha tem uma batedeira ótima da patroa. Não querem uns discos? Dinheiro não tem, pois ouvi dizerem que botam tudo no banco, mas ali dentro do armário tem uma porção de caixas de bombons, que o patrão é tarado por bombom.
Os ladrões recolheram tudo o que o falso empregado indicou e saíram apressados.
Daí a pouco chegavam a mulher e os filhos.
Sentado na sala, o marido ria, ria, tanto nervoso quanto aliviado do próprio assalto que ajudara a fazer contra si mesmo.
SANTANNA, Affonso Romano. Porta de colégio e outras crônicas, São Paulo: Ática 1995.
O texto “Assaltos insólitos” é uma crônica porque
a) expressa a opinião de um jornal ou de uma revista sobre um assunto da atualidade.
b) apresenta relatos de fatos com acréscimo de entrevistas e comentários.
c) retrata acontecimentos do cotidiano com caráter crítico.
d) sua função principal é a de divulgar uma informação visualmente.
e) apresenta uma moral no final do texto.
2 – (PUCCamp SP/2019)
Anda esquecido um forte romance, “Dona Guidinha do Poço”, de Manuel de Oliveira Paiva (1861-1892). O autor, jornalista cearense e combativo republicano, aluno que foi de Benjamin Constant na Escola Militar da Praia Vermelha, morreu cedo e seu romance teve um destino ingrato: publicados apenas seus primeiros capítulos numa revista do século XIX, só alcançou edição completa em livro em meados do século XX – já completamente desgarrado do Naturalismo que tão bem representou. Seu interesse hoje está, a meu ver, na singularidade da fazendeira Dona Guidinha, mulher de poder e empoderada, dona de personalidade acachapante e protagonista da história política de sua região cearense, qualidades que assumiu com radical coerência até o fim.
(Valdércio Coimbra, inédito)
Ao longo do século XIX, escritores com frequência publicavam crônicas, ensaios e artigos políticos nos jornais e revistas. Também nas formas narrativas longas alcançavam sucesso, antecedendo a forma de livro que logo adquiriam, como foi o caso
a) dos romances de folhetim, em que se destacaram autores como José de Alencar e Machado de Assis.
b) da prosa experimental de Oswald de Andrade em Memórias sentimentais de João Miramar.
c) do romance Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto.
d) das peças contundentes e sarcásticas de Martins Pena.
e) da série de novelas políticas empreitada por Joaquim Nabuco e Rui Barbosa.
3 – (IFMT/2019)
A luta e a lição
Um brasileiro de 38 anos, Vítor Negrete, morreu no Tibete após escalar pela segunda vez o ponto culminante do planeta, o monte Everest. Da primeira, usou o reforço de um cilindro de oxigênio para suportar a altura. Na segunda (e última), dispensou o cilindro, devido ao seu estado geral, que era considerado ótimo. As façanhas dele me emocionaram, a bem sucedida e a malograda. Aqui do meu canto, temendo e tremendo toda a vez que viajo no bondinho do Pão de Açúcar, fico meditando sobre os motivos que levam alguns heróis a se superarem. Vitor já havia vencido o cume mais alto do mundo. Quis provar mais, fazendo a escalada sem a ajuda do oxigênio suplementar. O que leva um ser humano bem sucedido a vencer desafios assim?
Ora, dirão os entendidos, é assim que caminha a humanidade. Se cada um repetisse meu exemplo, ficando solidamente instalado no chão, sem tentar a aventura, ainda estaríamos nas cavernas, lascando o fogo com pedras, comendo animais crus e puxando nossas mulheres pelos cabelos, como os trogloditas — se é que os trogloditas faziam isso. Somos o que somos hoje devido a heróis que trocam a vida pelo risco. Bem verdade que escalar montanhas, em si, não traz nada de prático ao resto da humanidade que prefere ficar na cômoda planície da segurança.
Mas o que há de louvável (e lamentável) na aventura de Vítor Negrete é a aspiração de ir mais longe, de superar marcas, de ir mais alto, desafiando os riscos. Não sei até que ponto ele foi temerário ao recusar o oxigênio suplementar. Mas seu exemplo – e seu sacrifício – é uma lição de luta, mesmo sendo uma luta perdida.
(Carlos Heitor Cony. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/ult505u247.shtml)
Ao escrever esta crônica, Cony, teve como intenção principal:
a) Criticar severamente a pessoas aventureiras que buscam a superação dos próprios limites.
b) Aconselhar aos atletas que praticam esportes radicais a não ousarem demasiadamente.
c) Revelar o desejo pessoal que também tinha de escalar o Everest.
d) Motivar às pessoas sedentárias para que também elas pratiquem esportes desde que moderadamente.
e) Refletir, com base em um acidente fatal, sobre a aspiração do humano em sonhar, projetar e superar desafios.
GABARITO:
1) Gab: C
2) Gab: A
3) Gab: E