Entenda porque é demorado o processo para criar uma vacina contra o coronavírus. Veja o que os cientistas precisam pesquisar e como as vacinas funcionam.
Estamos vivendo uma pandemia que se agrava a cada dia. Boa parte da população se encontra em quarentena, uma vez que o isolamento social é a nossa única forma de prevenção contra a infecção pelo coronavírus. Isso porque, não temos nesse momento uma vacina contra o coronavírus para imunizar a população.
Mas, por que demora tanto para uma vacina ser colocada à disposição? Para saber disso e muito mais sobre o coronavírus, veja esta aula de biologia!
Desde o final de 2019 o vírus 2019-nCOV tem feito milhares de vítimas ao redor do planeta. O rápido avanço da pandemia fez com que dezenas de países adotassem medidas drásticas para tentar conter a propagação da COVID-2019.
Enquanto a população aguarda uma vacina para o corona, a principal medida segue sendo o isolamento social. Mas, por que devemos nos isolar?
Isolamento social
O novo coronavírus parasita, principalmente, as vias aéreas superiores. Ou, seja, ele se aloja nos tecidos da garganta e do nariz. Sendo assim, quando uma pessoa contaminada fala, tosse ou espirra, acaba lançando gotículas de saliva ou secreção nasal contaminadas.
Dessa maneira, essas gotículas contaminadas podem ser aspiradas por pessoas próximas, ou ainda contaminar superfícies. Estudos mostram que o coronavírus 2019-nCOV permanece viável por bastante tempo sobre superfícies.
Assim, caso uma pessoa toque nessas superfícies contaminadas e leve a mão ao rosto, tocando as mucosas da boca, dos olhos e do nariz, pode estar se contaminando com o vírus.
Por conta dessa grande “sobrevida” fora do corpo humano e por ser transmitido pelo ar, o coronavírus possui uma grande capacidade de se espalhar. Para você ter uma ideia, a taxa básica de reprodução desse vírus está entre 3 e 6 (ainda são necessários mais estudos para chegar a uma maior exatidão).
Contaminação
Isso quer dizer que uma pessoa contaminada pode contaminar rapidamente, em média, de 3 a 6 pessoas. Para termos uma base para comparação, vamos pensar na gripe H1N1. O vírus H1N1 tem uma taxa de reprodução de 1,2. Bem menor que o coronavírus.
Outro ponto importante a ser frisado sobre o coronavírus é que pessoas infectadas que não apresentam sintomas, também podem transmitir o vírus. Essas pessoas, segundo estudos, representam dois terços dos infectados.
Além disso, as pessoas podem levar até 14 dias para apresentarem sintomas, ficando todo esse tempo transmitindo a doença sem saberem. Novamente comparando, o período de incubação do H1N1 é bem menor, de apenas 4 dias.
Diante de todas essas características descritas acima, você já deve ter percebido que o coronavírus tem uma enorme capacidade de se espalhar.
Assim, enquanto não há outra maneira para prevenirmos a COVID, o ideal é tentarmos bloquear o seu meio de transmissão. Para isso, precisamos do isolamento social. Cumprir a quarentena e seguir à risca os hábitos de higiene, diminui as chances de o coronavírus se espalhar.
E as vacinas contra o coronavírus?
Nos últimos anos, tem crescido o número de pessoas que participam de movimentos anti-vacinação. Devido à desinformação e muitas fake news, essas pessoas acreditam que as vacinas podem causar algum tipo de dano à saúde de quem as utiliza.
Por conta desses movimentos e das mentiras que eles espalham, vimos ressurgir nos últimos anos doenças que já haviam sido erradicadas em alguns locais, como o sarampo.
Porém, inúmeros estudos científicos já comprovaram que as vacinas são um dos melhores métodos para prevenirmos inúmeras doenças.
Para saber mais sobre esses sobre esses movimentos e a opinião de vários especialistas sobre as vacinas, veja esta reportagem do nosso canal do YouTube:
Dessa maneira, por que não utilizamos uma vacina para conter o coronavírus e a COVID-2019?
Como as vacinas funcionam?
Quando ficamos doentes, o nosso sistema imune age em diferentes frentes para tentar combater a doença. E, um dos efeitos mais importantes desse trabalho imunológico é a produção de anticorpos.
Os anticorpos são moléculas de glicoproteínas que ajudam a identificar antígenos que entram em nossos corpos. Eles são específicos, ligando-se em proteínas da superfície das células invasoras ou dos vírus, ou ainda a partes de toxinas.
Ao se ligarem a essas proteínas, os anticorpos ajudam a sinalizar para as células do sistema imune que aquele é um antígeno. Além disso, as ligações com os anticorpos podem impedir as vias de invasão das células, dificultando a instalação da doença.
Porém, apesar de serem muito efetivos, os anticorpos demoram a serem produzidos pelo nosso organismo. Em geral, os anticorpos só começam a ser produzidos após 7 a 14 dias do início da infecção. Nesse meio tempo, a doença pode já ter se instalado e os sintomas surgido.
Para adiantarmos esse processo de produção de anticorpos, usamos as vacinas. Sendo assim, o principal objetivo de uma vacina é a sensibilização prévia do sistema imunológico de um organismo. Através das vacinas, o organismo tem contato com os antígenos e passa a produzir anticorpos.
Mas, como as vacinas permitem que tenhamos contato com os antígenos previamente?
Para sensibilizar previamente nosso sistema imune, as vacinas são feitas, em geral, com antígenos (como vírus e bactérias) mortos ou atenuados (enfraquecidos), ou ainda, pedaços de toxinas.
Sendo assim, quando esses antígenos entram em nosso organismo através das vacinas, eles não vão nos causar doenças. Porém, eles vão estimular nosso organismo a produzir anticorpos.
Dessa maneira, quando entramos em contato com os antígenos naturais, já temos anticorpos contra eles. Assim eles entram em ação, impedindo que os antígenos parasitem nossas células e a doença se instale.
Como as vacinas são feitas?
Uma das primeiras vacinas das quais se tem registro foi feita pelo médico inglês Edward Jenner (1749 – 1823), em 1796. Jenner observou que pessoas que ordenhavam vacas muitas vezes pegavam varíola bovina, um tipo de varíola que acometia as vacas e que em seres humanos causava sintomas mais brandos que a varíola humana.
O cientista percebeu que essas pessoas, após ficarem doentes, não pegavam mais varíola. Nem bovina, nem humana.
O médico então, decidiu fazer um experimento. Jenner pegou pus das feridas de uma mulher infectada com varíola bovina e injetou em um menino de 8 anos saudável.
Obviamente, o menino ficou doente, uma vez que o pus continha os antígenos, nesse caso vírus, causadores da doença. Dois meses depois que o menino parou de apresentar os sintomas da doença, o médico inoculou novamente a criança com pus de feridas. Porém, dessa vez, ele usou pus de uma pessoa que apresentou sintomas de varíola humana.
Apesar de ter sido inoculado com vírus, dessa vez o menino não ficou doente. Dessa maneira (extremamente antiética e perigosa), Edward Jenner criou uma vacina.
Por que demora para fazer uma vacina contra o coronavírus?
Obviamente, os procedimentos realizados por Edward Jenner são cientificamente e eticamente inaceitáveis nos dias de hoje.
Para que uma vacina seja produzida, segundo a OMS, são gastos no mínimo 18 meses de estudos. Porém, normalmente, uma vacina envolve mais de uma década de experimentos e testes.
Isso porque, entre a descoberta de uma vacina e seu uso na população, inúmeros passos precisam ser dados.
Para começar, precisamos conhecer muito sobre o antígeno que estamos estudando. Para isso, algumas características do antígeno precisam ser levantadas. Veja algumas delas:
– Mapeamento da estrutura do antígeno;
– Mapeamento das vias de infecção utilizadas pelo antígeno;
– Conhecimento dos mecanismos de replicação do antígeno no organismo;
– Mapeamento das proteínas e estruturas que são usadas pelo antígeno para penetrar em uma célula.
Estudos pré-clínicos
Para responder a todas essas perguntas, os cientistas realizam estudos chamados de estudos pré-clínicos. Nesses estudos são feitos experimentos em laboratórios, onde o antígeno é analisado ao agir em cobaias ou culturas celulares.
Se todas as informações forem coletadas de maneira satisfatória, começam os estudos clínicos. Esses estudos envolvem testes em seres humanos. O objetivo desses testes é avaliar três quesitos, principalmente:
– Segurança:
é preciso saber se a vacina produzida produz efeitos colaterais indesejáveis na maior parte da população que irá receber o produto.
– Imunogenicidade:
é avaliada a capacidade da vacina em sensibilizar o sistema imunológico humano. Ou seja, a capacidade da vacina estimular a produção de anticorpos e células de defesa pelo organismo de quem foi vacinado.
– Proteção:
nesta fase avalia-se a duração dos efeitos da vacina.
Para que os testes tenham mais confiabilidade, as vacinas são testadas em três etapas. A cada etapa o número de pessoas vacinadas aumenta, aumentando a amostra.
Após esses estudos, todos os protocolos e resultados das pesquisas devem ser publicados em revistas científicas, como o The Lancet e a Nature. Essas publicações têm não só a função de divulgar os estudos, mas também possibilitar que outros cientistas não necessariamente envolvidos na pesquisa possam estudá-la e checar se tudo está correto.
Para você ter uma noção do rigor desses testes e de todo o processo para se colocar uma vacina no mercado, a OMS estima que de cada 5 mil moléculas (entre vacinas e medicamentos) que são testadas para uso em humanos, apenas uma chegará a ser produzida comercialmente.
Vacina contra o coronavírus. É possível?
Diante de tudo que falamos aqui, você já deve ter percebido que será bem difícil termos uma vacina contra o coronavírus em pouco tempo. A rigor, os cientistas nem mesmo têm estudos pré-clínicos suficientes sobre o coronavírus.
Sendo assim, testar em seres humanos uma vacina, é algo ainda mais distante.
Porém. Devido ao caos que a COVID vem gerando no mundo todo, medidas extraordinárias podem ser tomadas. Nesse caso, temos uma situação de exceção.
Em uma pandemia como a que estamos vivendo, as agências do mundo inteiro deixam os protocolos de aprovação muito mais brandos, com menos exigências.
Nesse caso, usa-se a lógica de que os riscos são suplantados pelos benefícios. Ou seja, se uma vacina contra o coronavírus conseguir imunizar boa parte da população, os riscos de possíveis efeitos colaterais são menores que o alastramento de uma pandemia.
Algo semelhante ocorreu com a pandemia de gripe H1N1 há dez anos. A produção de vacina contra o vírus dessa gripe foi uma das mais rápidas da história. Porém, os pesquisadores naquela época tinham uma vantagem: o vírus H1N1 era muito semelhante a outros vírus da gripe, então foram necessárias poucas adaptações para a nova vacina. O mesmo não podemos dizer para o a vacina contra o novo coronavírus, infelizmente.