Jean-Paul Sartre foi um filósofo francês, conhecido pelo movimento do Existencialismo. Ele acreditava que a existência precedia a essência.
Qual o sentido da vida? O que define nossa existência? Somos livres para escolher como viver? Foram essas questões que levaram o filosofo francês Jean-Paul Sartre a se debruçar sobre o Existencialismo garantindo a ele um local de destaque entre os intelectuais do século XX.
Quem foi Jean-Paul Sartre
Jean-Paul Charles Aymard Sartre foi o principal filósofo do movimento filosófico chamado de Existencialismo. Ele discutiu um tema que intriga a humanidade desde os primórdios da Filosofia, provavelmente até antes disso: a nossa existência.
Talvez você mesmo já tenha se perguntado sobre qual é o propósito da nossa existência? Ou quem sabe foi além e divagou a respeito do que é existir?
Bom, se você o fez provavelmente isso lhe trouxe algum crescimento pessoal, se não o fez, é interessante fazê-lo. Em todo caso, vamos adentrar esse tema em uma jornada com Sartre como nosso guia. Bora lá?
Figura 1. Jean-Paul Charles Aymard Sartre foi um filósofo, escritor e crítico francês, conhecido como representante do existencialismo.
Da Natureza Humana
Há quem diga que existe algo que faz de nós o que somos (bípedes implumes?), na Filosofia chamamos isso de Natureza Humana. Algo como uma essência predeterminada que todos os humanos têm.
Muitos eventos que aconteceram no mundo giram ou giraram em torno da Natureza Humana. As religiões abrâamicas, por exemplo, dizem que nós somos seres moldados a semelhança de um ser supremo – ao invés de bípedes implumes – e nosso agir está diretamente ligado ao “ser” lá no céu.
Como cópias – defeituosas – do “cara lá de cima”, somos fadados a herdar sua essência. Com isso nossa vida fica restrita a uma única maneira de viver, ainda que sejamos “livres” para não a seguir.
Todavia, isso implica em uma série de coisas, incluindo um pacote exclusivo de férias no inferno com duração de uma eternidade!
Influência da Grécia Antiga
Para além das religiões monoteístas dos desertos do Oriente Médio, existem também outros pontos que assumem que nós temos uma essência da qual somos imbuídos. É o caso do politeísmo em geral e de toda elemento considerado pagã, incluindo a mitologia grega.
Foram os gregos que vieram com esse papo de estudar Ética e com ela veio as noções de certo e errado, os valores e tudo mais.
Lá na Grécia antiga, Platão dizia que tudo o que existe possui uma natureza, algo que faz as coisas serem do jeito que são.
Em sua Teoria das Ideias Platão falou que nós temos uma essência imutável. E é aí o ponto de conflito quando fazemos o embate com Sartre. Isso porque o francês não concordava com a existência de uma natureza humana inalterada no tempo-espaço.
Figura 2. Sartre foi o autor da obra ‘O Ser e o Nada’ sua principal publicação. Embora, foram as citações de ‘O Existencialismo é um Humanismo’ que se tornaram populares por desenvolver o significado Ético do Existencialismo.
Entenda mais sobre Sartre com a videoaula:
O Existencialismo
Umas das frases mais famosas de Jean-Paul Sartre é aquela da Existência preceder a Essência, ela tem tudo a ver com esses pontos que vimos de Natureza Humana.
Grande parte das teorias que concebem uma Natureza Humana vem de metáforas que falam sobre um ser criador que nos faz com um propósito em mente, uma finalidade para nossa existência.
Para ficar mais fácil entender isso, imagine que você precisa dividir seu shawarma com a pessoa amada, para tanto você necessita de uma faca.
A existência precede a essência
Você então faz a escolha mais sensata e decide forjar uma. Visto que o propósito da sua faca é repartir um shawarma em dois pedaços iguais (porque se não dá briga) existem certos critérios que devem ser atendidos para que isso seja possível, bem como para que sua faca seja apenas isso, uma faca.
Esses critérios dizem basicamente que, seu utensilio doméstico tem que ser afiado o suficiente para cortar, do contrário não seria uma faca. Ele tem que ser pequeno para ser fácil de manejar, se não seria um facão ou uma espada, mas não pode ser curto demais se não seria um canivete.
Tampouco precisa ter ambos os lados afiados pois aí seria uma adaga, nem muito pontudo se não seria um punhal. Enfim, é impossível uma faca ser uma faca sem que se saiba a sua finalidade.
Ora, é basicamente essa essência que diferencia a lingerie do biquíni! Daí, o raciocínio de Sartre para justificar essa coisa da existência preceder a essência é bem simples.
Em uma analogia, diria que: um biquíni é arquitetado por alguém, nós não. Em outras palavras, como não existe uma entidade divina consciente que tenha nos criado, todo esse papo de Natureza Humana não passa de uma baboseira.
Contexto das ideias de Sartre
Sartre lutou na Segunda Guerra, foi capturado pelos nazistas e preso em campo de concentração! Esses eventos insanos, certamente influenciaram bastante em sua crença no divino, bem como, em tudo o que ele veio a teorizar depois.
Inclusive, ele se tornou um militante Marxista após retornar a França.
Além disso, Sartre era ateu, como a grande maioria dos filósofos do século XX, principalmente quando falamos daqueles que se dedicaram a corrente existencialista. Todavia, existe uma vertente chamada Existencialismo cristão, que pressupõe uma entidade divina.
Entenda mais sobre o Existencialismo cristão no vídeo abaixo:
Enfim, para que fique bem didático, veja um resumo sobre as ideias de Sartre e o Existencialismo.
Primeiramente, não há um deus e por isso nós não somos criados por um deus. Quando nós criamos algo, o fazemos com um propósito seja ele qual for.
Ao contrário de nossas criações, nós não fomos criados com quaisquer propósitos. Portanto, a nossa existência vem antes do nosso propósito, ou seja, a existência precede a essência.
Da Liberdade e do outro
Inspirado nas ideias de Martin Heidegger, Sartre tentou definir o que somos, isto é, o que é ser? Indo além das definições fisiológicas e das tautologias linguísticas, Jean-Paul fez uma análise da nossa essência.
Nós somos a única espécie que pode assumir a natureza que escolhermos, isto é, nossa essência é algo que cabe somente a nós.
Essa particularidade nos faz diferente de todas as outras espécies que habitam esse planeta. Em suma, você é aquilo que você escolhe fazer de si e nenhum outro animal pode sustentar tal afirmação além do ser humano.
Essa habilidade sui generis é baseada na nossa Liberdade e embora o conceito de Liberdade seja por vezes romantizado e problematizado, vamos entende-lo de maneira simples:
Conceito de liberdade para Sartre
Liberdade é a capacidade individual de optar com total autonomia, mas dentro dos condicionamentos naturais, por meio da qual o ser humano molda a si próprio.
Do mesmo modo, através da Liberdade nós conseguimos nos tornar seres ímpares em toda extensão do que conhecemos do mundo. Ora, diferente da gente, um ornitorrinco por exemplo, jamais poderá escolher ser anarquista ou escolher um time de futebol para torcer.
Todavia, vale ressaltar que para essa Liberdade ser vivida em sua plenitude é super recomendado nos desprendermos daquelas maneiras engessadas de pensar. A ideia é que devemos pensar além das construções sociais e preconceitos morais, pois nada disso é predeterminado.
Portanto, existe, segundo Sartre, uma infinidade de possibilidades para vivermos, pois se a existência precede a essência então tudo nos é possível. Contudo, como diria o Tio Ben (aquele do Homem-Aranha) com grandes poderes vem também grandes responsabilidades.
A liberdade é uma responsabilidade
Sartre já pensava nisso muito antes do cabeça de teia. Ele diz que a Liberdade é a maior das responsabilidades, uma vez que não somos responsáveis unicamente por nós. Nossas ações implicam em uma macro estrutura de relações e o resultado dessas ações impacta diretamente os outros.
Assim, sem nenhum princípio original que justifique nossas ações (já que nossa existência precede tudo isso) somos os responsáveis diretos por nossas ações e estas recaem sobre toda a humanidade, impactando o outro das maneiras mais diversas possíveis.
Conviver com o outro talvez seja o maior problema da sociedade. Analisando o mundo segundo a visão proposta por Sartre, fica evidente que meus valores, isto é, as coisas que considero importantes, podem ser diferentes das coisas que os outros consideram importantes.
Isso já era evidente nos primórdios da Filosofia quando as escolas helênicas divagavam sobre o nosso papel nesse mundo.
Diferenças entre a Antiguidade e Sartre
Em todo caso, a diferença da antiguidade para o que Sartre está falando, é que para o francês os outros não estão errados ou certos. Isso depende da visão de quem julga, ou seja, as outras pessoas são livres (assim como eu) para escolher fazer o que quiserem (lembra que a existência precede a essência).
Dessa maneira, surgem conflitos porque temos valores diferentes que se contrafazem.
Então é o olhar do outro que nos mostra quem somos, inclusive, nos mostra os ângulos que geralmente não gostamos, como nossos erros e falhas. Em outras palavras, Sartre conclui então que a Liberdade de outrem extingue a nossa própria Liberdade e nos torna apenas um objeto da Liberdade alheia.
Causando assim um aprisionamento em uma sombria solidão, em suma, o inferno são os outros.
É tipo aquela fase da vida em que nós deixamos de procurar os monstros embaixo de nossas camas, quando percebemos que eles estão dentro de nós. É desesperador, mas ao que parece faz parte do aprendizado de se relacionar com as outras pessoas.
Além de Sartre, Albert Camus e Friedrich Nietzsche também discutiram essas problemáticas sociais sob a luz do existencialismo.
Da condenação de ser livre
Até o momento, vimos que somos seres livres, sem nada em que nos apoiar. Pode até soar desesperador já que, sem um modelo a seguir nos encontramos sozinhos em um mundo caótico no qual tudo é permitido.
Aliás, essa é a razão pela qual as ideias de Sartre são consideradas pessimistas. No entanto, o filósofo faz apenas uma leitura realista da vida, mas na real, isso lhe deprime? Saber o quão sozinho você realmente está?
Reflita você mesmo, se nada possui um sentido predeterminado, então tudo me é permitido. Ora, se eu posso fazer o que quiser, então a vida é em si é algo sem sentido.
Todavia, as coisas que eu faço possuem um sentido, portanto eu sou o único responsável pelo sentido da minha vida, isto é, estou condenado a ser livre.
Otimista ou pessimista?
Então, indo além de ideia de um pensamento depressivo, ou mesmo pessimista, a visão de mundo proposta por Sartre pode ser bastante animadora. Isso porque não temos com o que se preocupar, podemos encarar a vida como uma aventura da qual não sairemos vivos.
Figura 5. Parafraseando um certo palhaço, poderia dizer que a verdadeira piada é a nossa convicção teimosa até os ossos de que de algum jeito ou de outro, tudo isso faz sentido! Isso me faz gargalhar toda vez!
Essa ideia coloca muita coisa em cheque! Noções como o racismo ou o machismo que pregam uma superioridade natural do branco sobre o negro ou do homem em relação a mulher, se tornam ainda mais absurdas frente a teoria proposta por Sartre. Inclusive, sua companheira Simone dialoga bastante com as ideias de Jean-Paul ao escrever sobre o Feminismo.
Por fim, Jean-Paul Charles Aymard Sartre foi uma grande influência do século XX, suas ideias são responsáveis por fundamentar inúmeras manifestações no mundo, mas principalmente na França, onde os movimentos libertários chegaram a derrubar o governo inspirados pelo filosofo.
Sartre permanece como um arauto da lucide em meio a uma sociedade insana, que acredita que o ser humano tem que ser de uma maneira especifica, enquanto na verdade ele pode ser infinito.
Exercícios sobre Sartre
1) (Ufsj 2013)
Na obra “O existencialismo é um humanismo”, Jean-Paul Sartre intenta
(A) desenvolver a ideia de que o existencialismo é definido pela livre escolha e valores inventados pelo sujeito a partir dos quais ele exerce a sua natureza humana essencial.
(B) mostrar o significado ético do existencialismo.
(C) criticar toda a discriminação imposta pelo cristianismo, através do discurso, à condição de ser inexorável, característica natural dos homens.
(D) delinear os aspectos da sensação e da imaginação humanas que só se fortalecem a partir do exercício da liberdade.
2) (Unioeste 2013)
“Quando dizemos que o homem se escolhe a si mesmo, queremos dizer que cada um de nós se escolhe a si próprio; mas com isso queremos também dizer que, ao escolher-se a si próprio, ele escolhe todos os homens. Com efeito, não há de nossos atos um sequer que, ao criar o homem que desejamos ser, não crie ao mesmo tempo uma imagem do homem como julgamos que deve ser.
Escolher isto ou aquilo é afirmar ao mesmo tempo o valor do que escolhemos, porque nunca podemos escolher o mal, o que escolhemos é sempre o bem, e nada pode ser bom para nós sem que o seja para todos. Se a existência, por outro lado, precede a essência e se quisermos existir, ao mesmo tempo em que construímos a nossa imagem, esta imagem é válida para todos e para a nossa época. Assim, a nossa responsabilidade é muito maior do que poderíamos supor, porque ela envolve toda a humanidade”.
Sartre.
Considerando o texto citado e o pensamento sartreano, é INCORRETO afirmar que
(A) o valor máximo da existência humana é a liberdade, porque o homem é, antes de mais nada, o que tiver projetado ser, estando “condenado a ser livre”.
(B) totalmente posto sob o domínio do que ele é, ao homem é atribuída a total responsabilidade pela sua existência e, sendo responsável por si, é também responsável por todos os homens.
(C) o existencialismo sartreano é uma moral da ação, pois o homem se define pelos seus atos e atos, por excelência, livres, ou seja, o “homem não é nada além do conjunto de seus atos”.
(D) o homem é um “projeto que se vive subjetivamente”, pois há uma natureza humana previamente dada e predefinida, e, portanto, no homem, a essência precede a existência.
(E) por não haver valores preestabelecidos, o homem deve inventá-los através de escolhas livres, e, como escolher é afirmar o valor do que é escolhido, que é sempre o bem, é o homem que, através de suas escolhas livres, atribui sentido a sua existência.
3) (Ueap 2011)
“A existência precede a essência.” O que melhor define esta frase do filósofo francês Sartre?
(A) Primeiro o homem existe, depois se define.
(B) O homem é o que ele concebe e não o que ele faz.
(C) O homem é “em si” e não “para si”.
(D) A vida de um homem está ligada a sua essência.
(E) A vida humana é totalmente determinada por Deus.
4) (Uema 2011)
O tema da liberdade é discutido por muitos filósofos. No existencialismo francês, Jean-Paul Sartre, particularmente, compreende a liberdade enquanto escolha incondicional.
Entre as afirmações abaixo, a única que está de acordo com essa concepção de liberdade humana é:
(A) O homem primeiramente tem uma essência divinizada e depois uma existência manifestada na história de sua vida.
(B) O homem não é mais do que aquilo que a sociedade faz com ele.
(C) O homem primeiramente existe porque sendo consciente é um ser em si e para o outro.
(D) O homem é determinado por uma essência superior, que é o Deus da existência, pois, primeiramente não é nada.
(E) O homem primeiramente não é nada. Só depois será alguma coisa e tal como a si próprio se fizer.
5) (Ufu 2012)
Leia o excerto abaixo e assinale a alternativa que relaciona corretamente duas das principais máximas do existencialismo de Jean-Paul Sartre, a saber:
“a existência precede a essência”
“estamos condenados a ser livres”
Com efeito, se a existência precede a essência, nada poderá jamais ser explicado por referência a uma natureza humana dada e definitiva; ou seja, não existe determinismo, o homem é livre, o homem é liberdade. Por outro lado, se Deus não existe, não encontramos já prontos, valores ou ordens que possam legitimar a nossa conduta. […] Estamos condenados a ser livres. Estamos sós, sem desculpas. É o que posso expressar dizendo que o homem está condenado a ser livre. Condenado, porque não se criou a si mesmo, e como, no entanto, é livre, uma vez que foi lançado no mundo, é responsável por tudo o que faz.
SARTRE, Jean-Paul. O Existencialismo é um Humanismo. 3ª. ed. S. Paulo: Nova Cultural, 1987.
(A) Se a essência do homem, para Sartre, é a liberdade, então jamais o homem pode ser, em sua existência, condenado a ser livre, o que seria, na verdade, uma contradição.
(B) A liberdade, em Sartre, determina a essência da natureza humana que, concebida por Deus, precede necessariamente a sua existência.
(C) Para Sartre, a liberdade é a escolha incondicional, à qual o homem, como existência já lançada no mundo, está condenado, e pela qual projeta o seu ser ou a sua essência.
(D) O Existencialismo é, para Sartre, um Humanismo, porque a existência do homem depende da essência de sua natureza humana, que a precede e que é a liberdade.
Gabarito
- B, 2.D, 3. A, 4. E, 5. C.