Revolução Farroupilha: Guerra dos Farrapos e preservação da cultura gaúcha

Conheça a história da Semana Farroupilha, que inclui a mais longa batalha do Brasil – a Guerra dos Farrapos, além da preservação da cultura e da tradição riograndense, mesmo com o passar dos anos.

O Brasil é o quinto maior país do mundo, com mais de 200 milhões de habitantes. Mas, se falarmos sobre uma pessoa usando lenço amarrado no pescoço, bombacha e tomando um chimarrão, provavelmente você vai saber que nos referimos à cultura do povo do Sul do Brasil, certo? 

Para os gaúchos, a Semana Farroupilha, comemorada no mês de setembro, é carregada de memórias e de significado. E é sobre isso que vamos falar hoje, te aprochega! 

História da Semana Farroupilha

Para entender melhor o que significa a Semana Farroupilha, é preciso recordar a história, que iniciou com a Guerra dos Farrapos, ocorrida no período em que o Brasil era um império, em 1835.

Devido a inúmeras questões de insatisfação, o povo do Rio Grande do Sul decidiu resistir contra a coroa exigindo mais autonomia. Mesmo com vestimentas simples, a população passou a pegar em armas e disse um basta. 

Eis que temos a guerra mais longa da história do Brasil! A Guerra dos Farrapos, que se estendeu até 1845. Ela não trouxe como resultados apenas os impactos de batalha e o grande número de mortes, mas também contribui para o fortalecimento da cultura do Rio Grande do Sul.

A Semana Farroupilha, portanto, tem como norte a lembrança da história dessa guerra e todos os seus desdobramentos, ao mesmo tempo em que amplia o leque de possibilidades sobre a cultura que nasce a partir dessa história.

A cultura gaúcha

A cultura gaúcha está fortemente relacionada a um povo que tem como características um sotaque bastante forte, vestimentas típicas, como a bombacha e o lenço, além da alimentação ligada ao churrasco, entre outras.

Assim, é construída a Semana Farroupilha, comemorada de 13 a 20 de setembro. Este é um período em que várias localidades do Rio Grande do Sul e de outras regiões – porque se expandiram para outros territórios -, param para relembrar e celebrar a cultura do povo gaúcho. 

Sim, as comemorações não se restringem à Guerra dos Farrapos, mas abraçam toda a história e a cultura desse povo, fazendo da Semana Farroupilha um lugar de memória. É quase como quando visitamos um lugar e olhamos tudo, como uma espécie de Museu? 

Então, podemos pensar que a Semana Farroupilha é isso: os gaúchos saem das suas casas e vão para as praças, escolas e centros de tradição para vivenciar essa memória que enaltece aquilo que eles praticam ao longo da vida, como o chimarrão, as danças, os bailes a vestimenta e tudo aquilo que é característico do gaúcho e que preserva essa cultura forte e resistente.

Churrasco e chimarrão 

Para entender melhor, observe, por exemplo, o churrasco típico do Rio Grande do Sul. Trata-se não só daquele churrasco de chão com costela e todos em volta atiçados pela vontade de comer. É mais do que isso, há uma história por trás, que traz a socialização desse povo, que se senta e escuta os “causos gaúchos”, lembram do passado e se veem no presente. É, portanto, um espaço de reflexão! 

Outro exemplo disso é o próprio chimarrão. Nenhum gaúcho toma chimarrão simplesmente por tomar. Há todo um ritual que faz parte da cultura e que é importante.

Quem nunca viu um gaúcho circulando em qualquer espaço do Brasil com uma cuia de chimarrão na mão? Para ele, aquilo não é só o ato de ingerir um líquido. É também um ato de celebrar e relembrar suas raízes, que também se relacionam com a cultura indígena e com as culturas vizinhas, do Uruguai e da Argentina.

Hino do Rio Grande do Sul

Outro aspecto que todo riograndense tem no coração é o hino do Rio Grande do Sul, que traz muito da história e de uma característica específica do gaúcho – a resistência -, muito associada, claro, à própria Guerra dos Farrapos.

Figuras marcantes 

A Semana Farroupilha também é espaço para relembrar Bento Gonçalves, uma das figuras mais marcantes – o líder da Guerra dos Farrapos, ou da Revolução Farroupilha -, que enfrentou um império em busca de autonomia para o Rio Grande do Sul. 

Todo o Brasil conhece também a boa música, não só tradicional dos bailes, mas também o rock feito pelas bandas gaúchas, ou ainda, já leu um livro do Érico Veríssimo, que traz muitas experiências do Rio Grande do Sul.

Ao estudar História, também é obrigatório conhecer um dos presidentes mais impactantes do Brasil, Getúlio Dorneles Vargas.

A cultura gaúcha é muito forte e se construiu a partir desse movimento de relembrar. Essa é  uma das coisas que a mantém forte e a faz ultrapassar as fronteiras do Rio Grande do Sul para o restante do país.

Afinal, quem é que nunca identificou um gaúcho pelo sotaque? Fica fácil de reconhecer porque eles mantêm essa cultura muito forte e consolidada. Mesmo ao sair do Rio Grande do Sul, o Rio Grande do Sul não sai deles.

É interessante ainda destacar que toda história é vista de um ponto e isso é um desafio não só para a história do Rio Grande do Sul e da Semana Farroupilha, como do Brasil inteiro. É fundamental cada vez mais ampliar a maneira de olhar para o passado. 

A Guerra dos Farrapos

O Brasil Regencial teve início em 1831 e isso impactou todo o território e, é claro, as gestões que haviam em cada localidade. Não foi diferente no Rio Grande do Sul. 

A Guerra dos Farrapos, também conhecida como Revolução Farroupilha, dependendo de cada região, foi a maior guerra em todo o território nacional contra o seu próprio povo. Esse movimento durou mais de 10 anos. 

Período Regencial no Brasil

De 1831 até 1840, o imperador Dom Pedro I partiu para Portugal e deixou seu filho, Dom Pedro II, com então 5 anos, no Brasil. 

Como ele ainda era muito pequeno, não podia governar o país. Então, logo vieram os regentes, como uma espécie de substitutos, para cuidar do Brasil até que o príncipe herdeiro pudesse assumir o trono.

Nesse meio tempo, a instabilidade tomou conta do país. Um dos motivos para isso é que havia um desejo de centralizar o poder na mão dessas regências. Isso porque, os regentes queriam tirar um pouco da autonomia das províncias, gerando um descontentamento significativo. 

No Rio Grande do Sul, as elites e outros grupos da sociedade ficaram bastante incomodados com a falta de liberdade e de autonomia. Além disso, o Império Brasileiro decidiu aumentar algumas taxas e impostos, reverberando no preço de um dos produtos mais importantes da época – a carne, chamada charque e também conhecida como carne de sol ou carne seca, dependendo da região do Brasil.

Isso acabou gerando um grande descontentamento e, liderados pela elite do Rio Grande do Sul, o povo passou a questionar a situação e a bater de frente com o governo regencial. 

Bento Gonçalves e o início da Guerra dos Farrapos

Bento Gonçalves da Silva – Wikipedia

Uma figura de destaque nesse cenário é Bento Gonçalves, um estancieiro de elite do Rio Grande do Sul, que passa a estimular o desejo do povo na busca pela autonomia dos  gaúchos. 

Em 20 de setembro de 1835, várias regiões do Rio Grande do Sul passaram a bradar, em uníssono, que o Centro do país explora o Sul, prejudicando economicamente a região. 

Um dos aspectos mais importantes em relação à Guerra dos Farrapos é o seu caráter separatista. Em debates de historiadores, alguns dizem que o mote era a autonomia, enquanto outros afirmam que a ideia era a separação, de fato, para então conquistar essa autonomia.

Todavia, um ponto fundamental é o desejo de ruptura com a monarquia e a consolidação de uma República, algo que já acontecia no restante da América. É importante recordar que, nesta época, o Brasil era a única monarquia do território americano. 

Vale ainda frisar que, no ano seguinte ao início da guerra, em 1836, aconteceu a proclamação da República Rio Grandense. 

Ao longo dos 10 anos de guerra, Bento Gonçalves foi bastante perseguido. Preso na Batalha do Fanfa, foi mandado para a Corte e depois encarcerado na prisão de Santa Cruz e mais tarde para o Forte da Laje, no Rio de Janeiro. 

Ali, apesar de preso, conseguiu receber visitas quase diárias de amigos e simpatizantes, também foi apresentado a Giuseppe Garibaldi e Rossetti. Em 15 de março de 1837, tentou fugir da prisão. Depois da tentativa de fuga, foi transferido para a Bahia, onde ficou preso no Forte do Mar. Lá sofreu uma tentativa de envenenamento.

Além de Bento Gonçalves, outras figuras, como Bento Manuel, Davi Canabarro e o italiano Giuseppe Garibaldi foram marcantes durante a revolução. 

A proclamação da República Rio Grandense, também conhecida como República de Piratini, em 1836, provocou embates cada vez mais calorosos contra o Império Brasileiro, que enviou tropas para conter as investidas gaúchas em busca de preservar a posse desse território. 

Proclamação da República Piratini Por Antônio Parreiras, 1915 Museu Antônio Parreiras

O nome, Guerra dos Farrapos, é devido à estrutura extremamente simples usada pelos gaúchos no enfrentamento aos soldados do Império – armas e roupas velhas, desgastadas e puídas. 

Expansão do conflito

O conflito não ficou restrito ao Rio Grande do Sul, e se expandiu até chegar ao estado vizinho, Santa Catarina.

Aqui, houve uma contribuição estratégica do italiano Giuseppe Garibaldi para conseguir chegar à região e emancipá-la, instituindo a República Juliana, tendo Laguna como local significativo dessa contribuição histórica.

A então capital de Santa Catarina à época, Desterro (atual Florianópolis), não apoiou o movimento e este é um dos motivos para que a República Juliana perdesse sua força.

Batalhas no Rio Grande do Sul

Já no Rio Grande do Sul, as batalhas foram muito marcantes e tiveram vitórias significativas dos farrapos, mesmo usando poucas armas e vestimentas nada preparadas para enfrentar o exército.

A lógica da resistência dessa luta está presente inclusive na cor vermelha das batalhas do Rio Grande do Sul.

A Batalha de Seival

A Batalha de Seival ocorreu em 20 de setembro de 1836, no Passo do Seival, localizado na região do atual município de Dom Pedrito, no Rio Grande do Sul. 

Os farrapos, liderados por Davi Canabarro e José Mariano de Matos, enfrentaram as forças do Império Brasileiro, comandadas pelo brigadeiro Francisco Rafael de Aguiar.

Os farrapos conseguiram uma vitória decisiva, o que teve um impacto significativo no desenrolar da Revolução Farroupilha. 

A derrota das forças imperiais enfraqueceu a posição do governo central na região e fortaleceu a causa dos rebeldes.

A Batalha de Porongos e o Massacre dos Lanceiros Negros

A Batalha de Porongos foi um evento trágico durante a Revolução Farroupilha, em 14 de março de 1844, que teve como palco o Cerro do Porongos, próximo à cidade de Caçapava do Sul, no Rio Grande do Sul.

Nesse confronto, as forças imperiais do Império Brasileiro enfrentaram os rebeldes farrapos liderados por Bento Gonçalves da Silva. O destaque dessa batalha foi o envolvimento de um contingente de lanceiros negros, composto principalmente por escravizados e libertos, que haviam sido recrutados pelos farrapos na tentativa de fortalecer suas fileiras.

No entanto, após um acordo entre os líderes farrapos e o governo imperial, esses lanceiros negros foram traídos e abandonados à própria sorte. A promessa de liberdade e igualdade não foi cumprida, e eles foram abandonados à mercê das forças imperiais, que os massacraram brutalmente.

Esse evento é conhecido como o “Massacre dos Lanceiros Negros”. Ele representa um triste episódio na história do Brasil, evidenciando as complexas questões sociais e raciais que permearam esse período, incluindo a exploração e a traição sofrida por aqueles que lutaram na esperança de obter liberdade e direitos.

A Batalha de Porongos e o subsequente massacre dos lanceiros negros são lembrados como um exemplo doloroso da trágica interseção entre os conflitos políticos e as lutas por liberdade e justiça social durante a Revolução Farroupilha. 

O fim da Guerra dos Farrapos

O fim da Guerra dos Farrapos foi marcado por uma série de eventos que culminaram na assinatura do Tratado de Poncho Verde, em 1º de março de 1845. 

Durante a guerra, o Brasil estava sem um imperador no trono, e o jovem Dom Pedro II assumiu o Império Brasileiro. Ao longo dos anos de 1843 e 1844, as tropas gaúchas começaram a sentir o cansaço e os impactos econômicos da guerra, já que manter um conflito armado é uma empreitada custosa. O número de mortes entre os farrapos também aumentou significativamente.

Diante da fragilidade dos farrapos, o líder imperial Luís Alves de Lima e Silva, o futuro Duque de Caxias, iniciou as negociações. 

Em 28 de fevereiro de 1845, um cessar-fogo foi estabelecido, marcando o fim das hostilidades. No dia seguinte, foi assinado o Tratado de Poncho Verde, que selou o fim da Revolução Farroupilha.

As negociações resultaram em compromissos importantes. O Rio Grande do Sul permaneceu parte do Brasil, e os combatentes farrapos foram integrados ao exército brasileiro. 

Algumas figuras envolvidas no movimento foram perdoadas para evitar punições. Além disso, escravizados que haviam lutado ao lado dos farrapos receberam sua liberdade.

Apesar da derrota oficial, a Revolução Farroupilha deixou uma marca profunda na história do Rio Grande do Sul. A história desse conflito é lembrada e usada como um ponto de referência na cultura e na identidade dos gaúchos. 

A luta pela liberdade e autonomia é celebrada durante a Semana Farroupilha e continua a influenciar a forma como os gaúchos percebem sua própria história e posição no contexto nacional.

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