As políticas de ações afirmativas têm o objetivo de reparar a desigualdade histórica e as desvantagens acumuladas e vivenciadas por certos grupos raciais ou étnicos.
Nesta aula de sociologia estudaremos quais os direitos da Constituição brasileira que envolvem o acesso à cidadania plena. Além disso, trataremos da questão das políticas de ações afirmativas, uma importante ação do Estado no que diz respeito à garantia de direitos aos seus cidadãos e cidadãs. Bora estudar?
A Constituição Federal de 1988 e a garantia de direitos
Nos dias atuais, a maioria das pessoas sabe que possui diversos direitos e que eles são garantidos às pessoas através das leis, estabelecidas principalmente por meio das Constituições. Mas, você conhece esses direitos?
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 é o documento principal que rege toda a legislação do país. Ela é chamada de “Constituição Cidadã” por ser reconhecida como um marco no que diz respeito à garantia de direitos relativos à cidadania e no estabelecimento dos deveres do Estado. É a sexta constituição que o país tem desde que se tornou República (ou a sétima, se contarmos desde a independência 1822).
Constituição e cidadania
A ideia de cidadania é antiga e foi entendida de diferentes formas ao longo da história. A forma como o conceito é entendido hoje tem relação direta com a existência do Estado-nação moderno.
Foi com o surgimento desse modelo de organização política que houve a ampliação da ideia de cidadão. A partir de então, “cidadão” passou a ser entendido como uma categoria que deve abarcar a todos os indivíduos pertencentes àquele território. Além disso, atualmente a cidadania remete à ideia de que somos todos/as iguais e, portanto, implica em igualdade de direitos e deveres.
Em Sociologia, quando o assunto é cidadania, é fundamental lembrar a divisão que o sociólogo britânico T. H. Marshall estabeleceu. Para esse autor, a cidadania plena envolve ter acesso de maneira efetiva aos direitos civis, políticos e sociais.
Direitos civis
Os direitos civis são aqueles que garantem as liberdades individuais, como o direito de pensar e se expressar, o direito de ir e vir, ou o acesso à propriedade privada, por exemplo.
Direitos políticos
Os direitos políticos são aqueles que garantem a participação nas relações de poder da sociedade, seja através da possibilidade de escolher seus representantes (ou seja, votar), de se candidatar a um cargo, ou de se organizar politicamente, como no caso dos partidos políticos, sindicatos ou movimentos sociais.
Direitos sociais
Os direitos sociais são aqueles considerados essenciais para a construção de uma vida digna e para o estabelecimento do bem-estar social.
Conforme disposto no artigo 6º da Constituição brasileira de 1988,
“são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados”.
Tais direitos visam a melhorar as condições de vida de todas/os. No entanto, dependem da atuação e da regulamentação do Estado brasileiro para que sejam garantidos.
Declaração Universal dos Direitos Humanos
Ser cidadão pleno é condição indispensável para a concretização dos direitos humanos e, sendo assim, as duas ideias têm uma forte ligação. Os direitos humanos foram descritos na Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), promulgada pela Organização das Nações Unidas em 1948.
O objetivo da DUDH é combater as ações discriminatórias e sua base principal são os direitos essenciais à vida, à liberdade e ao reconhecimento da pluralidade. A DUDH visa a garantir a universalidade dos direitos básicos para além das fronteiras de um determinado Estado-nação, assim como para além das divisões de classe social, raça, etnia, religião, gênero ou orientação afetivo-sexual. Aos diferentes Estados-nação, no entanto, atribui-se o dever de garantir tais direitos, protegendo-os contra violações.
Ainda que esses direitos estejam formalmente declarados, tanto na nossa Constituição cidadã quanto na Declaração Universal de Direitos Humanos, isto não é garantia de que eles sejam implementados na prática. Infelizmente, o acesso aos direitos e a cidadania plena ainda é um privilégio para poucos. Pode-se dizer que a igualdade está garantida apenas na lei, mas não é exercida.
Por outro lado, a existência formal de tais direitos possibilita a reivindicação deles. O processo de construção e do aprimoramento das garantias individuais e coletivas através dos direitos e das leis é um processo constante que foram/são conquistados através de diversas lutas políticas, muitas delas vinculadas aos movimentos sociais.
As ações afirmativas
Um grande exemplo dessa luta são as chamadas políticas de ações afirmativas, que têm o objetivo de reparar a desigualdade histórica e as desvantagens acumuladas e vivenciadas por certos grupos raciais ou étnicos. Assim, pretendem lhes garantir o acesso a oportunidades e tratamentos iguais.
É importante lembrar que a educação é considerada um dos principais meios de mobilidade social e de diminuição da desigualdade. Apesar disso, o acesso ao ensino superior no Brasil apresenta fortes marcadores de classe, raça/etnia e gênero, e em relação aos deficientes físicos.
Por este motivo, o acesso à universidade passou por diversas transformações relacionadas à criação de ações afirmativas e à ampliação do acesso de estudantes de escolas públicas, de baixa renda, pretas/os, pardas/os, indígenas e deficientes físicos.
Após longos debates sobre políticas de ações afirmativas que ocorreram desde os anos 1990, em 2012 foi aprovada a lei nº 12.711 que reserva vagas nas instituições federais de ensino superior e técnico a partir de critérios de renda e étnico-raciais.
Conforme essa lei, as instituições federais devem reservar no mínimo 50% das vagas dos cursos de graduação para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
Dentro dessa parcela, 50% (cinquenta por cento) devem ser reservados aos estudantes vindos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo (um salário-mínimo e meio) per capita.
Essas vagas reservadas também devem contemplar a proporção de autodeclarados pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade federativa em que a instituição de ensino está instalada. Tudo isso de acordo com os dados do último censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Outras formas de assegurar direitos além das ações afirmativas
Além de políticas como as ações afirmativas, existem diversas outras medidas e ações para garantir que, de fato, todas as cidadãs e cidadãos brasileiros tenham oportunidades iguais e que possam usufruir de todos os seus direitos de forma plena.
A Consolidação da Leis do Trabalho (CLT) e o Sistema Único de Saúde (SUS), são outros dois fortes exemplos de políticas e ação do Estado para assegurar o bem estar e uma vida digna para todas/os. Ainda que sejam consideradas conquistas históricas em relação aos direitos sociais, a luta pela manutenção e permanência dessas garantias continuam constantes e atuais no cenário político brasileiro.
Videoaula sobre direitos sociais
Em seguida, assista à aula da professor Alan, do nosso canal do Youtube, para saber mais sobre a luta por conquistas de direitos:
Exercícios
1- (Enem/2009)
Um aspecto importante derivado da natureza histórica da cidadania é que esta se desenvolveu dentro do fenômeno, também histórico, a que se denomina Estado-nação. Nessa perspectiva, a construção da cidadania na modernidade tem a ver com a relação das pessoas com o Estado e com a nação.
CARVALHO, J.M. Cidadania do Brasil: o longo caminho. In: Civilização Brasileira. Rio de Janeiro: 2004 (adaptado).
Considerando-se a reflexão acima, um exemplo relacionado a essa perspectiva de construção da cidadania é encontrado
a) em D. Pedro I, que concedeu amplos direitos sociais aos trabalhadores, posteriormente ampliados por Getúlio Vargas com a criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
b) na independência, que abriu caminho para a democracia e a liberdade, ampliando o direito político de votar aos cidadãos brasileiros, inclusive ás mulheres.
c) no fato de os direitos civis terem sido prejudicados pela Constituição de 1988, que desprezou os grandes avanços que, nesta área, havia estabelecido a Constituição anterior.
d) no Código de Defesa do Consumidor, ao pretender reforçar uma tendência que se anunciava na área dos direitos civis desde a primeira constituição republicana.
e) na Constituição de 1988, que, pela primeira vez na história do país, definiu o racismo como crime inafiançável e imprescritível, alargando o alcance dos direitos civis.
2- (Inst. Superior do TCE. Aplicado-CE/2016)
Art. 5º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo‐se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes” – Constituição Federal Brasileira de 1988.
(Disponível em https://sociologados.wordpress.com/2010/02/21/3%C2%BA‐do‐em‐a‐conquista‐dos‐direitos‐civis‐politicos‐sociais‐ehumanos‐no‐brasil/)
Através das informações contidas na citação e na charge, infere‐se que:
a) A “Constituição Cidadã”, como é conhecida a Constituição de 1988, é a mais completa até hoje no Brasil.
b) A Constituição, da forma como foi composta em 1988, coibe o preconceito ou as atitudes de perseguição às minorias étnicas.
c) Todas as leis das demais instâncias (municipais, estaduais…) devem obedecer às designações contidas na Constituição Federal.
d) Como “Lei Magna”, que rege todas as demais leis do País, a Constituição Brasileira precisa ser de conhecimento de todo cidadão brasileiro.
e) Não basta existir a lei para que ela seja efetivamente o reflexo da realidade. Uma lei passa a “existir”, efetivamente, quando ela é cumprida.
3- (PUC-SP/2019)
“A longa lacuna na história dos direitos humanos, de sua formulação inicial nas revoluções americana e francesa, até a Declaração Universal das Nações Unidas em 1948, faz qualquer um parar para pensar. Os direitos não desapareceram nem no pensamento nem na ação, mas as discussões e os decretos agora ocorriam quase exclusivamente dentro de estruturas nacionais específicas. […] O nacionalista italiano do século XIX Giuseppe Mazzini captou o novo foco sobre a nação quando fez a pergunta retórica: ‘O que é um País […] senão o lugar em que os nossos direitos individuais estão mais seguros?’. Foram necessárias duas guerras mundiais devastadoras para estilhaçar essa confiança na nação.”
Hunt, L. A invenção dos direitos humanos; uma história; São Paulo: Companhia das Letras, 2009. – p. 177 e 178
A partir da leitura atenta do fragmento, pode-se concluir que:
a) A Formação dos Estados Nacionais é resultado da ascensão da burguesia europeia que buscou uma aliança com os antigos monarcas medievais, dotando-os de poder absoluto que serviria como instrumento das propostas liberais em voga, desde o final da Idade Média.
b) Os Estados Nacionais se constituíram, ao longo da História, como exclusivos instrumentos da ordem social, gerando, obrigatoriamente, segurança e liberdade para todas as camadas e prezando sempre pelo cumprimento das demandas, de suas populações, em detrimento aos interesses privados ou de determinados grupos.
c) A noção de Estado Nacional, desde os tempos hobbesianos, deriva da necessidade de segurança, bem comum e garantia da inserção da maioria nas decisões legais que devem moldar as relações sociais.
d) A proposta de Estado Nação foi ganhando novos contornos ao longo da História. Durante os séculos XVIII e XIX os Estados Nacionais passaram a se tornar palco, dentre outros fatores, da inserção dos direitos humanos e outras garantias individuais.
Gabarito:
- E
- E
- D