Abolição da Escravatura no Brasil: racismo e consequências

A escravidão no Brasil teve início por volta da metade do século XVI e foi oficialmente abolida em 13 de maio de 1888. No entanto, a assinatura da Lei Áurea não representou uma transformação real na vida dos ex-escravizados, nem significou o fim do racismo no país.

A escravidão foi oficialmente abolida no Brasil em 13 de maio de 1888. Mas o que mudou na prática com a abolição da escravatura?

A lei nº 3.353, conhecida como Lei Áurea, foi nomeada de uma forma que reforça a ideia de grandiosidade dessa medida legal, que decretou o fim da escravidão em todo o território nacional.

Mas será que essa abolição representou uma mudança real para a população negra? Entenda o contexto histórico e as consequências desse marco com a nossa aula de História

Introdução ao Movimento Abolicionista

Veja agora com o professor Eduardo Volpato, o Dudu do canal do Curso Enem Gratuito, como foi o movimento abolicionista e como se conquistou a Abolição da Escravidão em 13 de maio de 1888.

Contexto da Abolição da Escravatura

Apesar da fama e da importância da Lei Áurea — conhecida pela maioria dos brasileiros até hoje —, o texto da lei era extremamente curto. Com apenas dois artigos, ela decretava o fim da escravidão, mas não previa nenhum tipo de reparação ou apoio à população negra, que viveu por mais de três séculos sob esse regime.

Ainda assim, a abolição foi suficiente para enfraquecer as últimas bases do Império. Pouco mais de um ano depois, em 15 de novembro de 1889, a República foi proclamada.

A origem da Escravidão no Brasil

Quer relembrar como tudo começou? Assista ao resumo sobre a escravidão no Brasil com o professor Eduardo Volpato:

Abolição e o Declínio do Império

A assinatura da Lei Áurea foi uma das últimas tentativas do Império de recuperar prestígio. O documento foi assinado pela princesa Isabel durante a ausência de seu pai, Dom Pedro II.

Naquele momento, o Império ainda era popular entre as camadas mais pobres. A abolição era vista como inevitável, especialmente após leis anteriores que já indicavam um processo gradual.

Por outro lado, a elite estava dividida. Enquanto a burguesia urbana via a escravidão como um atraso econômico e político, muitos latifundiários ainda defendiam o uso da mão de obra escravizada. O grande impasse era a indenização: os fazendeiros queriam compensação financeira pela “perda” dos escravizados — o que não aconteceu. Esse foi um dos principais motivos da ruptura entre a elite agrária e o Império.

Manchete da abolição da escravatura
Manchete da Gazeta de Notícias (13/05/1888) anunciando a Lei Áurea. Fonte: https://cutt.ly/NgxXeLh.

O contexto que precede à Lei Áurea

A estrutura socioeconômica do Império era sustentada pela escravidão. Por isso, não é coincidência que a Proclamação da República tenha ocorrido tão pouco tempo após a abolição.

Confira mais detalhes neste vídeo do Curso Enem Gratuito:

Consequências da Abolição da Escravatura

A elite abolicionista não tinha como prioridade a inclusão social da população negra. Na prática, a abolição da escravidão e a queda do Império pouco alteraram a realidade das pessoas negras.

Muitos já estavam libertos antes de 1888, por meio de fugas ou outras leis. O exército, inclusive, já se recusava a recapturar fugitivos. No campo, onde o trabalho escravizado era mais comum, muitas famílias negras permaneceram nas fazendas, agora em troca apenas de moradia e alimentação, já que não havia nenhuma política de seguridade social.

Nas cidades, os libertos enfrentaram a marginalização. A política de imigração europeia foi intensificada com o objetivo de “branquear” a população. Leis urbanísticas afastaram os negros dos centros urbanos, empurrando-os para as periferias. Foi assim que surgiram os primeiros morros e favelas em cidades como Rio de Janeiro e Florianópolis (antiga Desterro).

Trabalhadores negros numa plantação de café
Através de uma série de leis e transformações urbanísticas, a população preta e pobre passou a ser afastada dos centros, sendo empurradas para territórios periféricos. Em cidades como o Rio de Janeiro e Florianópolis (antiga Desterro), este foi o início da ocupação dos morros e origem das favelas. Fotografia mostrando escravizados negros trabalhando em plantação de café. Fonte: https://cutt.ly/DgxXUQd.

Fim da escravidão?

Do ponto de vista trabalhista, poucas mudanças aconteceram após 1888. O Brasil continuava sendo um país agrário e demandava grande quantidade de mão de obra. A mecanização do campo só se intensificaria no século XX, gerando o êxodo rural.

Até hoje, ainda há casos de trabalho análogo à escravidão nas zonas rurais. A abolição não eliminou o racismo estrutural herdado do regime escravista.

Lei Áurea - Abolição da escravatura
O Brasil foi o último país da América a abolir a escravidão, já que essa era a mão de obra do principal setor da sua economia. Mas abolir a escravidão não significava abolir o racismo. Imagem digitalizada do documento da Lei Áurea, de 13 de maio de 1888. Fonte: https://cutt.ly/VgzUAkK.

Após a abolição da escravatura, a população negra continuou a sofrer com preconceitos que foram utilizados para justificar sua escravização, como “inferioridade intelectual”, “propensão ao trabalho braçal, a vagabundagem e à criminalidade”.

Esses preconceitos foram responsáveis pela marginalização, encarceramento e segregação desta população até os dias de hoje. Atualmente, a maior parte da população carcerária e os postos de trabalho menos qualificados no Brasil são compostos por indivíduos negros. Em atividades braçais, como a limpeza das cidades, criação de crianças e construção civil, a presença negra é majoritária.

Castigos corporais ainda continuaram acontecendo, principalmente em instituições militares. Eles foram o principal motivo da Revolta da Chibata em 1910, liderada por João Cândido. Práticas culturais com origens africanas, como a capoeira e o samba, deixaram de ser criminalizados apenas a partir da década de 1930.

Culturalmente os “espaços de brancos e pretos” ainda eram separados. A escravidão pode ter sido abolida no final do século XIX, mas suas consequências ainda são combatidas até os dias de hoje.

Exercícios sobre a abolição da escravatura

1- (UNICAMP SP/2020)

Os números indicam que antes da abolição de 1888 restavam pouco mais de setecentos mil escravos no Brasil. Conforme estimativa do censo de 1872, elaborada pelo IBGE, a população total do país era de 9.930.478 habitantes. Isso indica que grande parte da população de cor (pretos e pardos) já havia adquirido a liberdade por seus próprios meios antes da Lei Áurea.

(Adaptado de Wlamyra Albuquerque, A vala comum da ‘raça emancipada’: abolição e racialização no Brasil, breve comentário. História Social, Campinas, n. 19, p. 99, 2010.)

Com base no excerto e nos conhecimentos sobre a história da liberdade no Brasil, assinale a alternativa correta.

a) A maioria da população negra já era liberta antes de 1888, porque as províncias escravistas do Sudeste, almejando abrirem-se para a imigração italiana, vinham adotando medidas abolicionistas desde o fim do tráfico, em 1850.

b) Em termos globais, o grande percentual da população livre de cor reflete o peso demográfico da população liberta concentrada nas províncias pouco dependentes da escravidão, como Santa Catarina e Paraná.

c) A maioria da população africana e seus descendentes já era livre quando a Lei Áurea foi aprovada, porque vinha obtendo alforrias através de uma multiplicidade de estratégias, desde o período colonial.

d) O alto número de libertos antes de 1888 reflete o impacto da abolição dos escravos por parte do Imperador D. Pedro II, pois a família real era a maior proprietária de cativos durante o século XIX, na região do Vale do Paraíba.

2- (PUC SP/2019)

Durante o século XIX o problema da mão de obra escrava Leia atentamente os fragmentos abaixo. foi se intensificando não apenas no Brasil, como em diversas partes do mundo. Muito se atribui isso às pressões britânicas, sobre a escravidão cada vez mais constantes.

Assinale a alternativa que melhor indique uma razão para tais pressões e uma consequência diretamente vinculada ao nosso território.

a) A Revolução Industrial, sobretudo em sua segunda fase, gerou uma produção acelerada, necessitando de um amplo mercado consumidor. No Brasil buscaram-se alternativas nos imigrantes europeus, e as leis abolicionistas foram seguindo seu curso normal.

b) Uma preocupação humanitária que sempre delineou as relações diplomáticas inglesas, resultou, aqui no Brasil, em um amplo movimento abolicionista que atingiu todas as camadas sociais.

c) Uma forte preocupação com as mortes que vinham ocorrendo nos chamados “navios tumbeiros”. Esse contexto foi refletido por aqui, por meios da criação de regras claras de bom convívio entre brancos e negros africanos que vinham trabalhar em nossas lavouras.

d) busca por mercados consumidores para os seus produtos levava a Inglaterra a pressionar todas as formas de trabalho que pudessem ameaçar essa lógica, o que resultou, aqui no Brasil, na imediata abolição da escravatura.

3- (Unicentro PR/2019)

“A Lei Áurea era mesmo popular e conferia nova visibilidade à princesa Isabel e à Monarquia. No entanto, politicamente, o Império tinha seus dias contados ao perder o apoio dos fazendeiros do Vale do Paraíba. Apesar do clima de euforia reinante, parecia ser o último ato do teatro imperial. […]. Nos jornais e nas imagens da época, Isabel passa a ser retratada como uma santa a redimir os escravos, que aparecem sempre descalços e ajoelhados, como a rezar e a abençoar a padroeira. Já a princesa surge de pé e ereta, contrastada com a posição curvada e humilde dos ex-escravos, que parecem manter a sua situação – se não mais real, ao menos simbólica.

Aos escravos recém-libertos só restaria a resposta servil e subserviente, reconhecedora do tamanho do “presente” recebido. Estava inaugurada uma maneira complicada de lidar com a questão dos direitos civis. Sem a compreensão de que a abolição era resultado de um movimento coletivo, permaneceríamos atados ao complicado jogo das relações pessoais, suas contraprestações e deveres: chave do personalismo e do próprio clientelismo.

Nova versão para uma estrutura antiga em que as relações privadas se impõem sobre as esferas públicas de atuação. Como se fôssemos avessos a qualquer associação com a violência, apenas reproduzimos hierarquias que, de tão assentadas, pareciam legitimadas pela própria natureza. Péssima lição de cidadania: a liberdade combinada com humildade e servidão, distante das noções de livre-arbítrio e de responsabilidade individual. ”

SCHWARCZ, Lilia. Abolição como Dádiva. In: FIGUEIREDO, Luciano (org.) A Era da Escravidão. Rio de Janeiro: Sabin, 2009, p. 88-90.

A respeito da Lei Áurea é correto afirmar.

a) Além da liberdade, foi concedida para cada ex-escravizado uma gleba de terras para que pudesse trabalhar e manter sua família.

b) Foi estipulada uma indenização individual de um conto de réis para cada ex-escravizado a título de indenização pelo seu trabalho compulsório anterior.

c) A lei estipulou um sistema jurídico que punia como crime contra a humanidade qualquer forma de exploração e preconceito.

d) A Abolição da escravidão proporcionou, ao Imperador Pedro II, maior apoio dos cafeicultores e, dessa forma, protelou a Proclamação da República.

e) A assinatura da Lei Áurea não significou o fim do preconceito racial e não propiciou acesso à terra ou a qualquer outra forma de indenização às populações libertas.

Gabarito:

  1. C
  2. A
  3. E

Sobre o(a) autor(a):

Ana Cristina Peron é formada em História pela Universidade Federal de Santa Catarina e mestranda em História na mesma universidade. Também é redatora do Curso Enem Gratuito e do Blog do Enem.

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