O Niilismo é uma corrente filosófica que teve origem no século XVIII, e que defende que a existência não tem sentido além daquele que atribuímos a ela.
O Niilismo é uma “parada” que surgiu nos meados do século XVIII, quando o Idealismo Alemão era acusado de ser niilista. Isso ocorreu porque as teorias do filósofo Immanuel Kant desestruturaram os alicerces intelectuais da época de tal maneira que os paradigmas vigentes acabaram por ruir.
O nada e a quebra de paradigmas
Com a publicação da obra de Immanuel Kant (1724 – 1804), A Crítica da Razão Pura, vários dos debates que a precederam tornaram-se obsoletos, visto que eram apoiados no que denominamos Metafísica Clássica – ou a “parada” que Kant refutou. A Metafísica Clássica foi, durante um bom tempo, a principal ferramenta da Filosofia para desvelar o mundo que nos cerca.
Tirou-se então o foco do ‘o que é?’ e entraram em cena perguntas acerca dos limites daquilo que podemos conhecer. Em outras palavras, não adianta querer saber a realidade última das coisas se antes não soubermos se essa realidade pode ser conhecida por nós.
Entretanto, vos pergunto: o que “diachos” é o nada? “Se liga” na “treta”: para respondermos isso, é preciso atribuir algum valor ao nada e, consequentemente, transformar o nada em algo!
Zeus do céu! Então como afirmar que existe o nada? Ao que parece, é impossível concebermos a ideia de nada, pois não dá para falar que ele é algo, já que assim ele deixa de ser nada e se converte em algo.
Contexto do Niilismo
É por isso que Kant, embora não seja um niilista, é uma figura necessária para compreensão do Niilismo. Ora, ele postulou que não adianta ficar perdendo tempo com umas coisas que a gente não pode conhecer como, por exemplo, o nada, o infinito, a perfeição, a idade do Silvio Santos, se Capitu traiu ou não Bentinho ou mesmo Deus. Em vez disso, cabe a nós o conhecimento daquilo que pode ser conhecido.
Deixando meu “camarada” Kant de lado por um momento, outro fator importante que devemos levar em conta ao falarmos da origem do Niilismo foi a revolução científica que se deu no século XVII. Inclusive, temos um post sobre um dos maiores filósofos do século XVII, Galileu Galilei, e suas contribuições para a revolução científica.
Em seguida, avançando para século XVIII, a maioria dos pensadores da época detonaram com a Metafísica Clássica e a hegemonia da religião. O Ocidente, especialmente a Europa, acabou por ficar desconfiado daquelas verdades de outrora. Dessa forma, as produções intelectuais da Igreja caíram em descrédito.
Enquanto isso, no século XIX, essa descrença ganhou mais força e passou ser estudada com afinco por alguns pensadores. Assim, livres dos grilhões da religião e da opressão dos Estados despóticos, intelectuais como Arthur Schopenhauer (1788 – 1860) e Friedrich Nietzsche (1844 – 1900) se tornaram notórios por suas perspectivas realistas e críticas muitas vezes ácidas a sociedade da época.
Origem do Niilismo
A fim de não nos perdermos em meio a esses diversos acontecimentos históricos, bora elencar os fatores que corroboraram para o surgimento do Niilismo? Já falamos da guinada do pensamento causada por Immanuel Kant. Somado e ela, houve também a revolução científica e o descrédito da igreja. Lembre-se que já tinha até rolado a reforma protestante, então a Igreja Católica estava enfraquecida.
Tudo isso fez com que a maneira de enxergar o mundo mudasse, dando origem, então, a novas possibilidades de interpretação das coisas. Uma dessas possibilidades foi o Niilismo. Portanto, a origem do Niilismo está ligada ao ceticismo do pensamento moderno e à intensa mudança de paradigmas que levou as instituições tradicionais da época ao descrédito.
As características do Niilismo
Fundada a partir da descrença em que o mundo vivia no pós-Iluminismo, o Niilismo vai defender a ideia de que não há uma finalidade última (Thelos) no mundo, em oposição aos discursos religiosos. Ademais, essa corrente filosófica também faz frente à autoridade do Estado e outras instituições que tentam reger as pessoas.
Portanto, o Niilismo se configura na destruição dos valores de outrora, destruindo todas as convicções que temos acerca da possibilidade de se responder àquelas questões fundamentais levantadas pela humanidade desde os primórdios. Dessa maneira, o sentido que a vida assumia antes, seja ele religioso ou algum outro, deixa de ser o foco do problema.
Ora, se não há um sentido para vida, o que há então? Bom, segundo o Niilismo, não há nada, isto é, não há um sentido para a vida além do sentido que atribuímos a ela. Isso impacta várias áreas da Filosofia, como a ética, a política e mesmo a metafísica. Isso ocorreu porque mudou-se o foco do nosso agir, pois deixou-se de lado aquelas verdades absolutas e aquelas finalidades existenciais.
Cara, “se liga”: antes a Filosofia se preocupava com o agir humano visando um fim específico. Por exemplo, “tenho que me comportar para ir para o paraíso”. Mas com a reviravolta causada pelo Niilismo, o poder de escolha está em nossas mãos e não mais subjugado a uma finalidade fajuta.
Dessa forma, o agir humano é dado de acordo com a nossa vontade e não de acordo com uma suposta finalidade (ir para o paraíso), pois não existem essas tais finalidades as quais entendíamos como verdades absolutas.
As teorias Niilistas
Atualmente, o Niilismo se configura em uma série de pequenas derivações de uma macro teoria. É possível encontrar pensadores associando Niilismo à luta de classes, ao anarquismo, ao positivismo, ao primitivismo, enfim, a lista é grande.
Entretanto, a base estrutural dos argumentos niilistas permanece a mesma. Todas as vertentes possuem um desapego das verdades absolutas do mundo, uma espécie de olhar cético para a existência em suas mais singelas faces.
Dos vários nomes que assumiram o manto de niilistas, o mais famoso e maior arauto dos preceitos niilistas, foi o filósofo Friedrich Nietzsche. Isso porque esse alemão peculiar defendia a ideia de uma ausência de sentido na existência humana.
Ele foi o responsável pela famigerada frase: “Deus está morto”, que até hoje provoca inquietação nos mais variados círculos de convivência. A ideia por trás da frase diz respeito àquela revolução na Filosofia que falamos há pouco, sobre não ser possível conhecer a verdade a respeito das coisas.
Essa afirmação serviu para denunciar uma Europa que ficou afundada no Niilismo na época em que viveu Nietzsche. Em seguida, veja o vídeo com o prof. José Carlos Bruni explicando essa afirmação tão controversa:
Atualmente ainda há muitos pensadores que tem o Niilismo como base para seu trabalho. Entretanto, talvez seja longe da academia que o Niilismo mais se tornou popular. Vemos no cinema, na música, nas tramas em quadrinhos e na cultura pop de maneira geral, muitos preceitos e fundamentos niilistas.
Por fim, o Niilismo é uma corrente filosófica que defende a destruição dos ídolos do passado e visa reestruturar o mundo a partir da vontade humana. Dessa maneira, retomaríamos aquilo que a religião roubou de nós e assim construiríamos um mundo livre de significados que não os nossos próprios.
Exercícios
1- (Enem 2016)
Vi os homens sumirem-se numa grande tristeza. Os melhores cansaram-se das suas obras. Proclamou-se uma doutrina e com ela circulou uma crença: Tudo é oco, tudo é igual, tudo passou! O nosso trabalho foi inútil; o nosso vinho tornou-se veneno; o mau olhado amareleceu-nos os campos e os corações. Secamos de todo, e se caísse fogo em cima de nós, as nossas cinzas voariam em pó. Sim; cansamos o próprio fogo. Todas as fontes secaram para nós, e o mar retirou-se. Todos os solos se querem abrir, mas os abismos não nos querem tragar!
NIETZSCHE, F. Assim falou Zaratustra, Rio de Janeiro. Ediouro, 1977.
O texto exprime uma construção alegórica, que traduz um entendimento da doutrina niilista, uma vez que:
a) reforça a liberdade do cidadão.
b) desvela os valores do cotidiano.
c) exorta as relações de produção.
d) destaca a decadência da cultura.
e) amplifica o sentimento de ansiedade.
2- (IFRS 2015)
Precisamente nisso enxerguei o grande perigo para a humanidade, sua mais sublime sedução e tentação – a quê? ao nada? –; precisamente nisso enxerguei o começo do fim, o ponto morto, o cansaço que olha para trás, a vontade que se volta contra a vida, a última doença anunciando-se terna e melancólica: eu compreendi a moral da compaixão, cada vez mais se alastrando, capturando e tornando doentes até mesmo os filósofos, como o mais inquietante sintoma dessa nossa inquietante cultura europeia; como o seu caminho sinuoso em direção a um novo budismo? a um budismo europeu? a um – niilismo?…”
(NIETZSCHE, Friedrich. Genealogia da moral: uma polêmica. Tradução, notas e posfácio de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 11-12.)
De acordo com o referido fragmento e considerando a totalidade do pensamento de Friedrich Nietzsche, podemos afirmar que a alternativa INCORRETA é:
a) A elaboração nietzschiana sobre o niilismo é a oportunidade em que o filósofo reconcilia-se com Immanuel Kant, julgando-o como aquela honrosa exceção que, em pleno século XVIII, salva guardou o pensamento alemão dos ataques da metafísica. Na opinião de Nietzsche, o imperativo categórico é o antídoto ao niilismo.
b) Uma das adversárias de Nietzsche é a moral da compaixão, pois nela se intensifica a decadência, a miséria e sua conservação. Sob a afirmação de “Deus” ou do “além”, como aquilo que genuinamente definiria a verdadeira vida, amoral da compaixão oculta o “nada”.
c) Nietzsche reconhece a ambiguidade do conceito de niilismo. Eis a razão pela qual ele diferencia o niilismo ativo do passivo. O niilista ativo é o “espírito livre” que reconhece e utiliza sua potência para ir além dos valores tradicionais. Já o niilista passivo, é o espírito cansado que se subordina à decadência dos valores religiosos e morais.
d) A disposição de afastar-se da aparência, da mudança, do vir a ser, do desejo, conduz o humano à vontade de nada, uma renúncia da vida que se configura como causa do niilismo.
e) Uma das expressões mais conhecidas de Nietzsche, com a qual o autor inicia suas análises sobre o niilismo, é o fragmento dedicado à morte de Deus. No aforismo de A Gaia Ciência, a morte de Deus conduz-nos ao diagnóstico da ausência de justificações absolutas e de orientações para o alcance do sentido da vida.
3- (UEG GO/2018)
Friedrich Nietzsche (1844-1900) é um importante e polêmico pensador contemporâneo, particularmente por sua famosa frase “Deus está morto”. Em que sentido podemos interpretar a proclamação dessa morte?
a) O Deus que morre é o Deus cristão, mas ainda vive o deus-natureza, no qual o homem encontrará uma justificativa e um consolo para sua existência sem sentido.
b) Não fomos nós que matamos Deus, ele nos abandonou na medida em que não aceitamos o fato de que essa vida só poderá ser justificada no além, uma vez que o devir não tem finalidade.
c) O Deus que morre é o deus-mercado, que tudo nivela à condição de mercadoria, entretanto o Deus cristão poderá ainda nos salvar, desde que nos abandonemos à experiência de fé.
d) A morte de Deus não se refere apenas ao Deus cristão, mas remete à falta de fundamento no conhecimento, na ética, na política e na religião, cabendo ao homem inventar novos valores.
e) A morte de Deus serve de alerta ao homem de que nada é infinito e eterno, e que o homem e sua existência são momentos fugazes que devem ser vividos intensamente.
Gabarito:
- D
- A
- D