O fim do segundo reinado e a crise da monarquia no Brasil

Veja os fatores que levaram a monarquia brasileira da estabilidade ao declínio a partir da metade do século XIX.

Muitos fatores culminaram para o fim do Segundo Reinado no Brasil: a economia, a política e o cenário internacional foram alguns deles. Vamos entender como esse processo ocorreu.

A crise que levou ao fim do Segundo Reinado

O segundo reinado brasileiro (1840-1889) já surgiu em um contexto de crise. Além da antecipação da maioridade de Pedro de Alcântara ser uma manobra dos liberais para aumentar sua influência na política, ela também era fruto da união das elites que temiam perder seus privilégios.

Esse medo era justificado, já que muitas revoltas do período regencial foram de caráter popular e questionavam a ordem social. Na visão das elites, somente um governo forte conseguiria prevenir o país destas insurreições. Ironicamente, o fim do Segundo Reinado não veio das camadas populares, mas sim de setores próximos às elites políticas.

Café e imigração no Segundo Reinado

A economia teve papel fundamental nesta nova etapa da história do Brasil, e o carro chefe do período era o café. O produto cultivado no Brasil chegou a abastecer mais de um terço do café consumido no mundo inteiro no século XIX. Sua entrada neste território ocorreu nos tempos de colônia, e aos poucos foi ganhando espaço.

Sua profusão ocorreu mesmo no século XIX, quando outros centros produtores como Java e o Haiti sofreram perdas nas suas colheitas, abrindo espaço para a oferta brasileira. Se antes o Brasil era conhecido pelo açúcar canavieiro do nordeste, a partir daquele momento passou a ser conhecido pelo café da região sudeste.fim do segundo reinadoFigura 1: Escravos trabalhando em fazenda de café no Vale do Paraíba, São Paulo. Fonte: http://twixar.me/fl2n

As principais lavouras de café do país encontravam-se em Minas Gerias, São Paulo e Rio de Janeiro, com destaque para a região do Vale do Paraíba, em São Paulo. Devido à economia do café, foi instalada uma ampla malha ferroviária na região sudeste que serviu ao transporte do produto, assim como de pessoas e ferramentas para as lavouras.

Substituição da mão de obra escravizada

A mão de obra escravizada foi direcionada para este setor, mas com a opção pela abolição gradual por parte do Estado brasileiro no fim do Segundo Reinado, essa realidade foi se modificando.

A mudança ocorreu pela adoção de políticas de incentivo à imigração de Europeus para o Brasil, com o intuito de substituírem gradualmente a mão de obra escravizada e embranquecer a população brasileira.

Os picos de imigração ocorreram na segunda metade do século XIX, devido às guerras de unificação da Itália e Alemanha, que produziram muitos refugiados.

O governo brasileiro financiava passagens e terras para famílias interessadas em se mudar para o Brasil. Quando estas pessoas chegavam, ficavam alguns dias nas cidades até se deslocarem para as zonas rurais, onde começariam a trabalhar para quitar sua dívida com o governo.

Vieram, sobretudo, alemães, italianos, espanhóis, portugueses e, posteriormente, japoneses. O lucro com o café também passou a possibilitar um modesto crescimento industrial, cuja mão de obra também foi abastecida com imigrantes que já tinham experiência em fábricas europeias.

Igreja Católica e Maçonaria

De acordo com a Constituição brasileira de 1824, o Brasil era uma monarquia constitucional, hereditária, representativa e católica. O culto a outras religiões era permitido, desde que fosse doméstico. Porém, a própria religião católica encontrava limites dentro do governo brasileiro, tendo seus bispos nomeados pelo imperador.

Além disso, graças ao inciso XIV do artigo 102, o imperador detinha o direito ao beneplácito, isto é, a aprovação da aplicação de medidas, regras e bulas expedidas pelo papa. Em outras palavras, o papa poderia até aprovar novas regras dentro da igreja, mas elas só seriam aceitas no Brasil mediante aprovação do imperador.

Porém, no ano de 1872, o beneplácito foi exercido pelo imperador para barrar a perseguição de membros da maçonaria por parte da igreja católica. Acontecia que o papa Pio IX alegava ser prisioneiro de Vitor Emanuel II, rei da Itália, após a unificação do país. Diversos membros importantes das novas elites italianas faziam parte de sociedades secretas como a maçonaria, e daí advinha a razão da perseguição encabeçada pelo papa.

Ocorre que, no caso brasileiro, muitas figuras próximas ao governo também faziam parte da maçonaria. Por isso, D. Pedro II se opôs à decisão do pontífice. O posicionamento do imperador foi contestado por sacerdotes católicos brasileiros, tendo alguns deles desobedecido a ordem imperial, o que culminou com prisões. O episódio acabou corroendo as relações entre igreja católica e a monarquia brasileira.

A Guerra do Paraguai

O maior conflito ocorrido na América do Sul também foi aquele em que o Brasil mais esteve envolvido, considerando-se gastos e mobilização de homens. Os efeitos da Guerra do Paraguai no Brasil foram para além das indenizações impostas aos derrotados: a partir deste processo, o Exército brasileiro ganhou mais força, influência e peso na política brasileira.

O fim do Segundo Reinado e a proclamação da república pelos militares, com apoio da igreja e da burguesia liberal, é um evidente resultado dos desdobramentos da guerra.

As origens do conflito remontam às relações entre Brasil e Uruguai. Este país, que havia se tornado independente do Brasil em 1828, tinha sua política dividida em dois principais partidos: os blancos, ligados aos latifundiários, e os colorados, ligados à burguesia liberal. Por diversas vezes o Brasil interviu, inclusive militarmente, para a auxiliar os colorados a chegar ao controle do Estado no país vizinho.

O interesse do governo brasileiro era poder se beneficiar economicamente com o apoio do partido. Neste sentido, o Brasil realizou uma invasão ao Uruguai em 1865 para destituir Atanásio Aguirre do poder, e colocar Venâncio Flores, do partido colorado, em seu lugar.

Nada disso teria maiores complicações, exceto pelo fato de que o governo paraguaio acompanhava com atenção os eventos ocorridos no Uruguai. Francisco Solano Lopez, presidente/ditador do Paraguai e aliado aos blancos, mantinha intenções desenvolvimentistas para seu país. Ele havia incrementado as forças armadas paraguaias há anos e preparava seus exércitos para uma manobra ousada, cujo principal objetivo era conseguir um acesso direto ao mar.

Tal conquista seria de suma importância, pois assim a economia do país poderia se desenvolver muito com mais possibilidades de relações comerciais entre nações. Assim, em apoio aos latifundiários uruguaios e em busca de acesso ao mar, López liderou uma incursão contra o Brasil e a Argentina rumo ao Uruguai, dando início à Guerra do Paraguai.

O primeiro movimento de Solano López é apreender o navio Marquês de Olinda que navegava pelo Rio Paraguai na região do Mato Grosso. Na embarcação estava Frederico Carneiro de Campos, presidente daquela província brasileira, que foi feito prisioneiro.

Em seguida, López invadiu a província argentina de Corrientes, dando mais motivos para o presidente Bartolomeu Mirtre, que já era apoiador dos colorados, a entrar no conflito. A ofensiva paraguaia chegou até o interior do Rio Grande do Sul, onde teve o avanço contido pelas tropas brasileiras.

Os governos brasileiro, uruguaio e argentino constituíram uma coalizão militar que recebeu o nome de Tríplice Aliança, dedicada a combater a ofensiva paraguaia. A partir de então, o Paraguai foi sofrendo sucessivas derrotas até sua total rendição. Solano López acabou morto por soldados brasileiros, e como resultado do conflito o Paraguai sofreu pesadas sanções pelos países vitoriosos.

A guerra teve grande impacto para o subdesenvolvimento do Paraguai, que além dos profundos danos sofridos continuou sem territórios no litoral. Para o Brasil, apesar dos altos custos da guerra, o processo resultou no fortalecimento do Exército enquanto instituição. As forças aliadas lideradas por Duque de Caxias impuseram grandes massacres aos paraguaios que foram enaltecidos no Brasil. Este é o caso da batalha do Avaí, que de tão celebrada acabou dando nome ao time de futebol catarinense.

O fim da escravidão

O território brasileiro foi palco da escravidão mercantilista desde os primórdios da colonização europeia. Por quase quatro séculos, diversas gerações de africanos escravizados foram trazidas para esta e outras partes da América vindo de diversas regiões como dos atuais Estados do Moçambique, Nigéria e Angola.

Estima-se que dos 12 milhões de indivíduos trazidos para o continente americano, 5,5 milhões tenham desembarcado no Brasil. Sendo assim, além de ter sido o último país a abolir a escravidão, também foi o que mais recebeu indivíduos nessa condição.

Porém, por mais lucrativa, rica e poderosa que fosse a escravidão, ela já começava a destoar dos novos ares europeus do século XIX. Isso se deve à influência e ao espaço que a economia industrial passou a conquistar. Na Inglaterra, berço da industrialização ocidental, a força de trabalho era assalariada, e por mais miserável que fosse a remuneração dos operários, isso ainda era um fator decisivo na concorrência com outros países.

Por conta disso, desde a vinda da família real para o Brasil, os ingleses trataram de pressionar os governantes portugueses a frear a escravidão na colônia. Era uma questão de tempo até que a industrialização se propagasse por outras nações, mas pior seria se nações com mão de obra escravizada passassem a investir neste setor.fim do segundo reinadoFigura 2: Luís Gama, advogado autodidata e líder abolicionista brasileiro. Fonte: http://twixar.me/20f1

De fato, a Inglaterra passou a provocar investidas maiores contra a escravidão no Brasil a partir da Tarifa Alves Branco, que provocou um surto industrial no país. Da política ofensiva inglesa resultou a Lei Eusébio de Queirós, que botou efetivamente em prática o combate ao transporte de negros para o Brasil.

Esse foi um sério golpe à escravidão no país, provocando uma inflação no setor mas sem encerrá-lo. Através da luta de abolicionistas como Luís Gama, Maria Firmina dos Reis, José do Patrocínio, André Rebouças, Francisco José do Nascimento (o “Dragão do Mar”) e Adelina, o combate a esta instituição se fortaleceu.

Dica: Confira esta matéria da BBC Brasil sobre lideranças abolicionistas no Brasil.

Antes da lei Áurea (1888), duas outras leis do fim do Segundo Reinado se destacam no processo gradual de abolição: a Lei do Ventre Livre (1871) e a Lei dos Sexagenários (1885). Nenhuma destas legislações garantiu a liberdade da população. No primeiro caso, mesmo afirmando a que os filhos de escravizados seriam livres a partir da sua promulgação, ela possibilitava que os senhores utilizassem sua mão de obra até os 21 anos. Já no segundo, ficava evidente sua baixa efetividade, pois a expectativa de vida dos escravizados possibilitava que poucos obtivessem esse direito.

Por fim, em uma tentativa de agradar a burguesia liberal brasileira, que via a escravidão como sinônimo de atraso, a princesa Isabel assina a Lei Áurea em 13 de Maio de 1888. Esta decisão, tomada enquanto seu pai estava em viagem ao exterior, simboliza um afastamento do governo com as elites agrárias que viviam da mão de obra escravizada.

Porém, na prática, poucos fazendeiros sofreram com a medida, já que muitos negros continuaram a exercer seus trabalhos nas fazendas por não possuírem casas e empregos. A Lei Áurea não garantia nenhuma política de inclusão ou ressarcimento pela escravização da população negra.

Muitos movimentos negros no Brasil contestam a data da abolição e a imagem da princesa Isabel enquanto símbolos da luta por liberdade justamente por não se tratar de motivações humanitárias.

Videoaula sobre a política interna e o fim do segundo reinado

Para terminar, assista à videoaula abaixo, em que o professor Felipe, de História, resumo os fatores que levaram ao fim do segundo reinado do Brasil!

Terminou o resumo. Agora é hora dos desafios!

Exercícios sobre o fim do segundo reinado

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Sobre o(a) autor(a):

Os textos acima foram preparados pelo professor Angelo Antônio de Aguiar. Angelo é graduado em história pela Universidade Federal de Santa Catarina, mestrando em ensino de história na mesma instituição e dá aulas de história na Grande Florianópolis desde 2016.

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